Quinta-feira, 18 de Outubro de 2007

A Importância da Reflexão na Igreja

Venham, vamos refletir juntos, diz o Senhor”. (Isaías 1:18 NVI)

A Bíblia Sagrada relata que Deus nos criou segundo Sua imagem e conforme Sua semelhança. Nós, seres humanos, somos dotados de alguns atributos especiais que nos foram comunicados por Deus no ato da criação. Temos em nós, portanto, uma pequena centelha daquilo que Deus tem em plenitude.

O principal destes atributos que nos foi comunicado por Deus é a capacidade de raciocinar e, quanto a isso, não há dúvidas, afinal, todos os atributos que nos tornam diferentes dos animais estão ligados ao raciocínio: livre-arbítrio, criatividade, percepção, capacidade de análise, etc. O ato de raciocinar possui uma importância muito grande dentro do nosso dia a dia e é impossível existir um relacionamento com Deus sem que haja reflexão.

A filosofia é a ciência que trata da reflexão em primeira ordem, ou seja, o tema principal que a filosofia aborda é o pensamento e suas várias formas. Umas das melhores definições de filosofia que já li é: “a tentativa de pensar racionalmente e criticamente sobre as questões mais importantes da vida, a fim de obter-se o conhecimento a sabedoria a respeito delas” (Moreland & Craig, 2005).

A filosofia exerceu um papel muito importante na história da Igreja. Homens como Policarpo, Irineu e Tertuliano usaram da filosofia e desenvolveram pensamentos sólidos contra a então ascensão gnóstica dentro do cristianismo. Agostinho, o mestre de Hipona, através do pensamento filosófico, fundou importantes alicerces para a ainda imatura fé cristã, respondendo com sabedoria acerca de assuntos ainda não definidos como a Salvação pela Graça e Trindade.

Alguns pensadores cristãos são lembrados e respeitados até hoje entre não-cristãos como: Tomás de Aquino, Anselmo de Cantuária, João Calvino, Blaise Pascal, Sören Kierkegaard, etc.

Os livros de história nos mostram que no século IV, os debates sobre Trindade e divindade de Cristo faziam parte do cotidiano dos simples camponeses que viviam ansiosos para ouvir os resultados dos debates teológicos e concílios. O quadro atual é bem diferente. Pouco a pouco, a filosofia tem sido extinguida do cristianismo a ponto de não se pensar mais dentro da Igreja. O teólogo R. C. Sproul (editor da Bíblia de Genebra) disse, e com razão, que vivemos no período mais anti-intelectual que a Igreja já vivenciou.

Não é raro ver cristãos abandonarem a fé após ingressarem na Universidade. Qual a razão disso? Na Universidade eles são confrontados e questionados diariamente em suas disciplinas. Na Igreja, no entanto, os cristãos aprendem a ter medo de pensar.

Sim, é verdade. Quer fazer um teste? Ouse questionar alguma ação de seu pastor. Você será tachado de insubmisso, será afastado dos cargos que exerce na congregação e talvez te proíbam de participar da Santa Ceia. Para justificar tal ato apresentaram alguma abordagem bíblica fora de contexto e soltam aqueles famosos jargões do tipo “não toque no ungido do Senhor”.

Em congressos de medicina, administração ou economia os participantes debatem fervorosamente sobre os assuntos em pauta, concordando e discordando, buscando o crescimento em suas respectivas áreas. No cristianismo acontece o oposto, ninguém discorda, todos concordam com tudo.

A Igreja pode dizer amém?

A infeliz realidade é que a liderança cristã nos ensina a não pensar. Os crentes crescem com medo de questionar, medo de pensar e medo de expor suas opiniões. Os cristãos são incentivados por sua liderança a limitar sua leitura apenas a livros devocionais ou de batalha espiritual sensacionalista. Muitos consideram a ciência como obra demoníaca por não conseguir acompanhar racionalmente os avanços dela.

É interessante observarmos as crianças. Elas não têm medo de pensar. Os pequeninos são verdadeiros desbravadores do conhecimento. Talvez seja essa uma das razões de Jesus ter dito que o Reino dos Céus pertence a elas. Elas têm ânsia de conquistar mais e mais conhecimento.

Já pararam para perceber como as crianças nos primeiros anos de vida gostam de acender e apagar a luz? Já perceberam como elas gostam de olhar para o espelho? Como gostam do barulho do molho de chaves? Como gostam de animais?

Uma criança descobre que ao apertar certo botão algo estranho acontece, surge uma luz. Uma sensação extasiante para ela. Com isso ela começa a aguçar os sentidos, a percepção.

Deus nos criou para pensar, para desenvolvermos nossa capacidade de raciocínio. As crianças demonstram isso pois ainda não tiveram este sentimento podado. Eu me recordo de que minha primeira reflexão teológica aconteceu quando eu ainda era criança. Minha mãe estava contando as histórias da Bíblia para eu e meus irmãos quando eu perguntei: “mãe, depois que Deus destruiu o mundo com a chuva ele prometeu que não destruiria mais a humanidade, por que então ele destruiu Sodoma e Gomorra?”. Não me lembro ao certo qual idade tinha, mas é certo que não devia ter mais que 6 anos.

Os pais não precisam se iludir. Tudo o que ensinam aos filhos será questionado cedo ou tarde. A forma como ela vai desenvolver aquilo que você ensinou vai definir se ela mudará ou não de pensamento. As crianças questionam toda informação que recebem. Seja em casa, seja na Igreja, seja na escola ou qualquer lugar.

É necessário que nós mudemos nosso conceito sobre o papel da reflexão dentro da Igreja. É necessário não temer. Se nós acreditamos que nosso Deus é onisciente e que ele transmitiu racionalmente tudo a nós através da Bíblia, não devemos temer questionamentos. Devemos ser a resposta que o mundo espera e não fugir das perguntas do mundo.

Penso, logo existo” dizia Descartes. Se pararmos de pensar, deixaremos de existir.

Venham, vamos refletir juntos...

Eliel F. Vieira
elielzadoque@gmail.com

5 Comentários:

Lethargica disse...

No judaísmo quanto mais você for estudioso e pensar mais perto você está de Dus. Não é à toa, que rabino não é um dom, é uma voca~ção, é aquele que conhece mais as escrituras que qualquer outro, a palavra rab em hebraico, quer dizer professor. Até o próprio Jesus estuda as escrituras tanto que quando confrotado dizia: "Está escrito". Se estudarmos bem as escrituras, saberemos quão suprema é a sabedoria que nos confronta. Não é à toa que na bíblia diz que fé "vem de ouvir e falar a palavra de D-us". Na época o sistema de sinagogas era de ieshivá... era uma roda onde todos sentavam para discutir as escrituras... como a maioria das igrejas primitivas nasceram de sinagogas, os primeiros cristãos eram bem estudiosos. Com a romanização da igreja- onde o cristianismo foi a grande desculpa do império romano para a conquista de novos territórios - o cristianismo conheceu as trevas que conduziria a igreja até os tempos medievais... e não progredimos em nada... tá até pior... só por estudar a bíblia hebraica e o novo testamento em hebraico e ver as traduções erradas que os cristãos manipulam e manipularam já briguei muito com um pastor... ele chegu a dizer que eu era do diabo(mas ele era um batista, se fosse um anglicano teria batido palmas pra mim). Por isso amo anglicanos, catolicos ou protestantes, CS Lewis era anglicano, daí vc tira a liberdade que eles dão para o ato de pensar... sem falar no INCLUSIVISMO, a permissão que vc tem de viver o seu próprio cristianismo... se vc é um africano, dance, pule pinote, se vc é um asiático, faça uma "hei" antes de entrar na igreja... procure sobre o inclusivismo anglicano Eliel. Acho que seria uma ótima opção de igreja pra vc, do jeito que os batistas estão decadentes, teremos que abandonar a igreja no final para continuarmos a viver como cristãos.

Rafael disse...

Observações interessantes. Em relação às Universidades, ainda que saindo um pouco do escopo do seu artigo, recomendo este artigo do Otto Maria Carpeaux: http://www.oindividuo.com/carpeaux1.htm

As universidades não fabricam apenas ateus, mas também são ótimas fábricas de heteróclitos. O ateísmo é consequência. O grande problema não está no não-pensar, mas sim no pensar errado. Hoje, as pessoas não pararam de pensar, mas pensam errado. Se você pegar um bom curso de Filosofia antigo, como o "Curso de Filosofia" do Regis Jolivet, isso será facilmente notado. Antigamente, ao estudar Filosofia, o aluno era apresentado a conceitos fundamentais sobre lógica, dialética, metafísica. Hoje, autores confusos e sofistas de baixo nível são despejados como a grande panacéia dos males do mundo. Assim, diante de pouco preparo filosófico, e diante do inter regnum filosófico que é colocado diante desses alunos, o caminho para o ateísmo, descrença e confusão filosófica é traçado, e sempre consegue angariar muitos adeptos.

Dentro da Igreja ocorre algo parecido, já que a maioria das Igrejas Cristãs são muito influenciadas pelo academicismo em voga no momento. Diante disso, não é de se espantar que homens de pouca oração e péssima praxis cristãs tentam se denominar teólogos, e assim, o caminho até as ruínas é traçado também dentro das igrejas. Assim como a salda filosófica atual, as igrejas sofrem com uma mistura de fideísmo, academicismo, ceticismo e tudo quanto é "ismo" que serve para inflamar o orgulho daqueles que não buscam pela verdade, mas sim pela pura vanglória e reconhecimento.

--
Abd Uahed Al Batin

Ana Rocha disse...

Eliel, como está? Tudo bem garoto?
Li seu texto, muito interessante.

Então vamos lá.

Sim, eu era uma pessoa religiosa, fui catequista, frequentava a Igreja Católica, fiz tudo dentro dos conformes, porém, como você disse, não nos é ensinado pensar.

Tudo nos é entregue como querem que sejam.

E já criança, como comecei muito cedo minha amizade com os livros, eu fui questionando, e quando eu comecei a dar catecismo foi a gota d'água, queria que as crianças aprendessem a pensar, questionassem, se sentissem livres, porém fui podada por uma senhora retrógrada.

O que aconteceu?

Me desiludi e procurei uma forma livre de acreditar em Deus e ser cristã. Pois sim, eu sou cristã, porém sem religião.

Porque acredito que a religião limita seus pensamentos e te controla, te poda.

E quando entrei pra faculdade, como você disse, quando comecei a ter aulas de filosofia, questionei Deus, parei de acreditar, por um tempo.

As vezes ainda coloco em dúvida, quando certas coisas não me parecem coerentes.

A Igreja tenta entregar para os crentes (usado aqui como os crentes em Deus)um pensamento já pronto, porém da maneira deles, como querem, acho que para manterem um certo controle sobre os seus fiéis.

Questionar, pensar, duvidar, acreditar, tudo faz parte do processo de crer.

Para chegar a crer em algo ou alguma coisa, em Deus, você passa por provas, por batalhas interiores, por questionamentos. E isso não é permitido.

E quanto mais você conhece, sim, como você disse, mais próximo d'Ele você ficará.

Conhecer é poder e crer.

Até para quem não acredita, é preciso acreditar que você não acredita em algo.

Então tá aí.

Muito legal seu texto.

E é isso aí Eliel, continue pensando assim.

Você tem muito a ensinar assim como todos nós temos.

Muito legal.

Mas pode parecer contraditorio, mas ás vezes eu ainda duvido, mesmo quando eu acredito.

rodrigo disse...

Como sempre, seus comentários são ótimos, não faltando com a verdade e não fazendo o que muitos lideres fazem hoje, Pregar a Palavra.
Essa pensamento na qual você colocou a mesa, nos faz pensar se, os lideres (ou a igreja)não nos incentiva a pensar por causa da Biblia ou para que fique mais fácil a nossa manipulação, fazendo sempre o que eles querem, sem precisar de base bíblica para nada.
“Ora, estes de Beréia eram mais nobres que os de Tessalônica; pois receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras todos os dias para ver se as cousas eram, de fato, assim" (Atos 17:11). Paulo operou sinais em Beréia, mas os cristãos dali determinaram se Paulo era de Deus ou não, comparando sua pregação com as Escrituras. (Deuteronômio 13:1-5; Jeremias 23:25-32; 1 Coríntios 12:1-3; 1 Tessalonicenses 5:21 podem ser estudados para mais ajuda neste ponto).
Devemos amar nossos lideres, respeitá-los mas quando falamos de Palavra de Deus, esta acima de tudo.
Isso ai Eliel, fica na paz!

Leonardo de Paula disse...

Seus textos são muito bons.Muito reflexivos.Tenho lido bastante, estudado sobre filosofia, e com certeza o uso dessa ciencia em conjunto com a Palavra de Deus, é perfeita (minha humilde opiniao.
E o que vc disse sobre questionar liderança, praticar o "livre-pensar", é exatamente isso !!! Tem toda razão.

Um abraço

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