Domingo, 11 de Novembro de 2007

Epistemologia: Como Ateus e Teístas se saem?

Já citei em outro texto meu o problema que os ateus tem com sua posição evidencialista>. Outro problema do ateísmo dentro da Filosofia é referente a epistemologia.

Existem crenças verdadeiras e falsas. Um pós-modernista poderia questionar essa frase. Não vou entrar aqui nas teorias sobre a verdade (pois necessitaria escrever outro texto maior que esse apenas para introduzir sobre o assunto), mas, se não existem verdades (como o pós-modernismo ensina) logo, o pós-modernismo não pode ser verdade, portanto não devo acreditar nele.

Epistemologia é o ramo da Filosofia que tenta explicar a natureza do conhecimento, da razão e das crenças justificadas e injustificadas. Todas as pessoas possuem crenças. Não devemos confundir aqui crenças com cosmovisões ou posições religiosas. Ao dizer crenças, me refiro ao simples ato de acreditar em algo. Se você disser isso a algum cético e ele disser que não acredita em nada, questione como então ele então pode “acreditar” na teoria dele.

Também não vou me deter aqui aos pormenores quanto à justificação epistêmica, suas variantes, etc. Qualquer boa enciclopédia de Filosofia trata disso. O assunto é interessantísmo e recomendo a todos que estudem e pesquisem.

Para começar, vamos tomar um exemplo para desenvolver o raciocínio: Você está dentro de casa e percebe que o vento está soprando. O vento não bate em você, mas pelo fato de perceber que as folhas estão balançando, você deduz que o vento está soprando. Ou seja, sua crença de que o vento está soprando (S) está baseada em outra crença: as folhas estão se movendo (R).

Temos então: R -> S

Essa cadeia de crenças é chama de cadeia epistêmica. Existem duas teorias que tentam explicar como uma estrutura noética deve ser construída: o fundacionalismo e o coerentismo. Dentro de ambas as teorias existem inúmeras subdivisões que não serão abordadas aqui para não estender demais a resposta. Vou apenas fazer uma breve explanação sobre cada uma delas:

Para fundacionalista, existem diferenças de crenças: básicas ou não-básicas. As crenças básicas são, de algum modo, imediatamente justificadas. As crenças não-básicas são mediatamente justificadas de alguma maneira pelo relacionamento com as crenças básicas. Crenças como “existe uma árvore diante de mim” são básicas, pois não se baseiam em outras crenças e sim em nossa percepção.

O fundacionalismo pode ser descrito da seguinte forma: (P crença básica) -> Q -> R -> S.

Já o coerentista afirma que não existem crenças básicas, que todas as crenças necessitam de justificação e que as crenças só podem ser justificadas por outras crenças. Para o coerentismo uma crença é verdadeira se, e somente se, ela fizer parte de um conjunto coerente de crenças. Como seria isso?

Vamos voltar ao exemplo do vento. De acordo com o coerentismo, a pessoa sabe que o vento está soprando (R) porque as folhas estão balançando (S). A pessoa acredita que as folhas estão balançando porque a pessoa ouve as folhas balançando (T). A pessoa ouve as folhas balançando porque o vento está de fato soprando (R).

O coerentismo pode ser apresentado da seguinte forma: R -> S -> T -> R

Tanto o fundacionalismo como o coerentismo possuem seus problemas. O fundacionalismo tem dificuldades para explicar como uma crença pode ser básica e verdadeira sem necessitar de justificação. O coerentismo apresenta argumentos circulares e não há uma base sobre a qual se sustentar. O principal problema com o coerentismo é que ele dá margens para que todas as crenças e cosmovisões do mundo possam ser verdadeiras, desde que seu sistema de proposições (estrutura noética) seja coerente.

Não se chegou a um consenso filosófico ainda e, para o presente texto, não é necessário termos uma definição absoluta sobre qual teoria destas teorias representa melhor a forma como deve ser construída uma estrutura noética. Por hora, vamos descartar o coerentismo. Por quê? Pois, se o coerentismo fosse verdadeiro tanto o ateísmo como o teísmo seriam crenças verdadeiras justificadas, o que é, racionalmente, impossível.

É importante também não confundir Teísmo com Deísmo. O Teísmo apresenta Deus como ser único e pessoal, onipotente e onisciente que se relaciona com sua criação. O Teísmo engloba as religiões monoteístas (Cristianismo, Judaísmo e Islamismo). Já o Deísmo apresenta Deus como impessoal e que não se relaciona com a criação.

Voltando ao assunto, o fato é que todos, tanto ateus como teístas, fazem uso do fundacionalismo, baseando todas suas crenças em uma crença básica não justificada. A crença básica dos ateus é que Deus não existe. E a crença básica dos teístas é que Deus existe.

O interessante é que, sempre que são questionados sobre suas crenças básicas, ateus e teístas recorrem ao coerentismo. Se um teísta for questionado sobre a razão de sua crença em Deus ele poderá responder: “porque eu não acredito que a vida possa ter surgido do acaso”. Com os ateus acontece o mesmo. Quando questionados sobre a crença básica da não-existência de Deus alguns respondem: “não acredito, pois se Ele existisse já havia se revelado a nós”. Ou seja, esse ateu fundamenta sua crença básica na crença de que, se Deus existisse, Ele se manifestaria aos homens visualmente.

Qual das duas posições então é mais racional? Como já vimos, se levarmos em conta o coerentismo, as duas posições podem ser verdadeiras, o que já descartamos. E se levarmos em conta o fundacionalismo?

Aqui o ateísmo se enrola. Pois ninguém pode ter percepções da inexistência de algo. Alguém pode ter percepções de uma cor que nunca viu? Alguém pode ter percepções de uma música que nunca ouviu? Não, em nenhum desses casos isso é possível.

Os ateus afirmam que a falta de percepções sobre algo, é a prova que esse algo não existe. O que não é verdade. Se uma criança nunca viu a cor lilás ela nunca irá ter percepções sobre o lilás até o dia que ela conhecer o lilás. Mas a cor lilás não deixará de existir simplesmente porque essa criança não teve percepções sobre ela.

Se algo existe: Podemos ter percepções e podemos não ter percepções.
Se algo não existe: Jamais podemos ter percepções sobre esse algo.

Os teístas (mais particularmente os cristãos) afirmam possuir uma testificação interna do Espírito Santo de Deus quando crêem. Isso vale como justificação epistêmica? Para os cristãos sim, para os ateus não. Acaso algum ateu irá se satisfizer com alguma percepção sobre Deus? O dia que isso acontecer, a pessoa deixará de ser ateu (exemplo: Francis Collins). E também, o ateu só se satisfará com as percepções que apóiem sua crença. Existe alguma percepção de Deus que implique na inexistência de Deus? Não.

Esse texto é apenas introdutório. Epistemologia é um ramo de estudos muito vasto com várias linhas de raciocínio diferentes. Eu recomendo a todos que leiam sobre esse assunto e que comecem a questionar mais as coisas que acreditamos.

Eliel Vieira

3 Comentários:

Guilherme disse...

Interessante como podemos ter o poder de questionar, de querer saber mais e nem sabemos o que estamos questionando.
Esse texto é otimo para questionamentos de de ateus para com nós cristaos.
Abraço

Erika Bet disse...

mto legal o blog :)

adorei isso.. "Voltando ao assunto, o fato é que todos, tanto ateus como teístas, fazem uso do fundacionalismo, baseando todas suas crenças em uma crença básica não justificada."

eh oq eu sempre pensei!!

Dayana disse...

Adorei esse blog mto interessante.

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