Quarta-feira, 4 de Fevereiro de 2009

Quem Sou Eu?


Ao editarmos um perfil no Orkut somos confrontados pela pergunta “quem sou eu?” para que nós – aqueles que estamos criando o perfil – falemos um pouco de nós mesmos.

Se você possui uma conta no Orkut, faça um teste: dê uma visita em alguns perfis e veja em quantos perfis você encontra uma resposta que satisfaça a pergunta “quem sou eu?”.

Eu fiz o teste. Escolhi 10 perfis aleatórios, de “amigos” que eu não conhecia e o resultado foi: nenhuma resposta (ou tentativa de resposta) a essa pergunta. No espaço destinado a esta resposta alguns postaram links de suas comunidades ou de sites que gostam, outros os links de sua banda de rock, outros postavam algumas frases poéticas. Nenhum dos 10 se preocupou em responder à questão e explicar quem ela é. É bem provável que se eu vasculhasse todos os 600 amigos que tenho no Orkut, a grande maioria (se não todos eles) terão se esquivado da pergunta.

A verdade é que as pessoas em geral não se preocupam com o que elas são, não apenas os usuários do Orkut. É bem provável que você responderá “Eu sou [seu nome]” quando alguém te perguntar quem é você, apesar da pessoa ter te perguntado “quem você é?” e não “qual nome você tem?”.

As pessoas, ao que parece, associam tudo o que elas são e possuem (seus sentimentos, seus sonhos, seus desejos, seus prazeres e seus defeitos) ao seu nome. O nome identifica o que a pessoa é para ela mesma, por isso a resposta mais comum à pergunta “Quem é você?” geralmente é “Eu sou Fulano”. Algum psicólogo me corrija se eu estiver enganado, pelo menos é assim que a situação aparenta ser.

Porém, as pessoas são mais que sentimentos, sonhos, desejos, prazeres e defeitos. Uma pessoa em estado vegetativo ainda é uma pessoa, mesmo sem apresentar nenhuma das características acima. Somos mais do que o nome que levamos e somos mais do que nossas características dizem sobre nós mesmos.

O que somos então?

Esta é provavelmente a questão mais complexa que existe. Ela se relaciona com todas as outras questões que envolvem nossa existência, muitas delas sem resposta. Por exemplo: para um ateu, o homem é a espécie animal que apresenta maior grau de complexidade na escala evolutiva, sendo moldado da forma que foi por um processo chamado “Seleção Natural”; já um cristão responderia que o homem é a obra prima dentre todas as criações de Deus, criado segundo a Imagem e Semelhança de Deus.

A diferença entre as duas respostas sobre o que é o homem depende, portanto, de uma resposta acerca da existência de Deus. Conhecimento que, em suma, não pode ser atingido.

Alguns filósofos tentaram responder a esta questão, mesmo sabendo que a questão é praticamente irrespondível.

O matemático e filósofo francês Blaise Pascal (1623 - 1662) disse: “Pois, em suma, que é o homem no seio da natureza? Um nada em face do infinito, um tudo em face do nada, um meio entre o nada e o todo. Infinitamente longe de compreender os extremos. O fim e o princípio das coisas estão, para ele, envoltos para sempre num mistério impenetrável, e é igualmente incapaz de ver o nada de onde foi tirado e o infinito que o rodeia por todas as partes.” [Pensamento 66 (72)].

René Descartes (1596 - 1650), atordoado com a possibilidade de todo conhecimento que possuía não ser verdadeiro, decidiu fundamentar seu conhecimento em bases sólidas. Para atingir este grau absoluto de certeza, começou a questionar todo conhecimento que tinha com o ceticismo, com a dúvida. Descartes percebeu que, antes que pudesse duvidar de sua própria existência, ele deveria existir para duvidar que existia, logo, se duvidava, existia. “Cogito, ergo sum” – “Penso, logo existo” – concluiu o pensador. A única certeza que o homem pode ter de si mesmo é que ele existe.

Alguns aplicaram a filosofia de Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) sobre a essência das coisas para explicar o que somos. Para Aristóteles, tudo o que existe, existe porque existe uma substância – essência – que faz o algo existente ser o que é. A essência é o que dá identidade ao ser. O que é o homem? Segundo a filosofia de Aristóteles, o homem é um ser cuja essência é a humanidade, diferente do cachorro, cuja essência é sua “cachorricidade”. Não é piada, o pensamento aristotélico é esse mesmo.

A filosofia existencialista, inaugurada por Søren Kierkegaard (1813 - 1855), veio negar a aplicação do pensamento aristotélico em relação à existência do homem. O existencialismo foi popularizado no século passado por Jean Paul Sartre (1905 - 1980), para quem “A existência precede e governa a essência”.

Em 1946, no "Club Maintenant" em Paris, Jean Paul Sartre pronuncia uma conferência, que se tornou um opúsculo com o nome de "O Existencialismo é um Humanismo". Sartre disse: "... se Deus não existe, há pelo menos um ser, no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito, e que este ser é o homem ou, como diz Heidegger, a realidade humana. Que significa então que a existência precede a essência? Significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se define. O homem, tal como o concebe o existencialista, se não é definível, é porque primeiramente é nada. Só depois será, e será tal como a si próprio se fizer.".

Quem sou eu então?

Difícil responder.

Sei que existo, mas não sei (e ninguém sabe) responder por que, como e para que existo sem apresentar junto com minha resposta minhas opiniões (que são apenas minhas e podem ser diferentes das suas) sobre o mundo. Sei que um dia meu corpo não mais vai existir, mas eu não posso (e ninguém pode) dizer se minha psiqué continuará existindo após o que chamamos de morte sem expor opiniões pessoais sobre o mundo. Sei que nós humanos somos os únicos que podemos pensar sobre estas questões, mas não posso dizer (sem apresentar minhas opiniões pessoais) se isso é obra de um Deus criador ou se é fruto do acaso da Seleção Natural (ou de ambos).

Por fim, sei que quanto mais estudamos e refletirmos sobre nós mesmos, mais dúvidas surgem. A existência se revela a nós se escondendo.

Apenas quem não sabe nada acha que sabe tudo. E não pensem que o dogmatismo é uma exclusividade dos religiosos. Os ateus apresentam tanta certeza sobre suas opiniões (para questões cujas respostas são inatingíveis) quanto os religiosos. Mais sábio é aquele que busca incessantemente por respostas que ele sabe que não atingirá. Ele não conseguirá tudo, mas conseguirá mais que todos os outros.

Eliel F. Vieira
elielzadoque@gmail.com

10 Comentários:

LuDe disse...

muito bom seu blog.
bem organizado.. ta de parabéns!

http://ludedelu.blogspot.com/

Pablo Basílio disse...

gostei do seu blog.Em relação ao que você escreveu eu ainda nao havia percebido isso.Quando eu tinha um orkut, na área destinada do"quem sou eu" eu coloquei uma simples frase: DEPENDE DE VOCÊ.Nunca consegui me descrever por vários motivos e um deles era o "medo" de parecer convencido.No espaço eu colocava também o link do meu blog que por sinal, está bem legal - eu acho.rsrs

volto aqui mais vezes, até mais.

http://pablobasilio.blogspot.com

Leo Pinheiro disse...

Eu acho um saco quando colocam músicas ou trechos de livros famosos... De resto eu reparo muito pouco. Prefiro que sejam descrições suscintas como a minha.

Eu sou exatamente o que está escrito no Okt e no blog! Pode conferir.

Alice Daniel disse...

Ninguém, ou pelo menos a maioria das pessoas, não consegue responder a essa pergunta. Temos inúmeros "eus" dentro de nós.
Tempos atrás recebi um email para decifrar a pessoa em uma palavra. Passei o email adiante e surpreendi-me com o que pensam de mim.

Pr Julio Soder disse...

Acho que também sou destes que não falo muito de mim. Acho que toda auto-biografia é tendenciosa, parcial e imprecisa. Assim como não posso me ver fisicamente de corpo inteiro também acho que há coisas em mim que só são notadas por outros, mesmos que distorcidas. O meu coração é enganoso e acho que só Deus sabe quem sou de fato. Lembro agora de uma citação de Paulo: "...nem eu tampouco julgo a mim mesmo...quem me julga é o Senhor." I Cor 4:3-5.
Mas eu entendi o seu ponto de vista.
Também acho que responder "quem sou" requer exame e nem sempre isto é agradável.
Um abraço.

Carol disse...

gostei do blog!!!
agora um simples "quem sou eu" no orkut foi levado muita a serio....
como se o orkut comandasse nossa vida, é obrigatoria responde-lo com clareza?
mas interessante vem mais a baixo, gostei, filosofar sobre as coisas q ninguém presta atenção é legal!^^ adoro filosofia! parabens!

Rayane Cássia disse...

Agente acha muito difícil se decifrar, na verdade não perdemos tempo tentando juntar um pouco de tudo que forma o nosso eu, e sinceramente nem sei se seria possivel sabermos de tudo.
Somos o que sentimos, o que fazemos as pessoas sentir, cada pessoa vai ter um conceito de você, e o certo é que se você tentar se decifrar vai encontrar em ti inúmeros defeitos e qualidades :)

Ana disse...

O orkut sem querer apela para um lado filosófico. O nosso nome nunca será a resposta para o que ou quem somos, mas tambem não pode ser considerado um mera identificação. Estudos dizem que o nome tem significados, e esses significados podem se tornar caracteristicas de quem possui o nome.

Bem, eu adorei o teu blog, parabéns
Abraços

Jonathan disse...

Que textao ein!!! kkk

É bem legal toda a analise que vc faz a partir de uma pequena questao orkutiana.

Quem eu sou?

É uma grande questao que assombra o homem desde que o mesmo tem alguma cosciencia de si. E acredito que definir-se é algo dificil, senao impossivel, pois,usando Sarte, ele mesmo disse que o homem é chamado a ser aquilo que nao é, ou seja, o homem se faz a cada instante. Uma coisa que é agora, poderà nao ser amanha.

Parabéns pelas questao levantada.

Alexandre Alves disse...

nossa, este texto me convidou a uma reflexão acerca de como me enxergo e como me permito divulgar quem sou para os outros. admito que qd se pede no orkut para q diga quem sou eu desvio a resposta para letras de músicas. Bom, elas tb tem a funçao d mostrar um pouco o q sou, mas não é tão direto qto o fato d dizer com todas as letras o q sou e o que gosto ou gostaria de ser.
Texto provocativo. gostei muito.
Abraços.

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