Certa vez eu ouvi de meu pai algo bastante interessante: as moscas fazem cocô nas lâmpadas. Sim, isto mesmo! Sabe estas lâmpadas elétricas redondinhas comuns que temos em casa? As moscas adoram aliviar seus ventres lá por alguma razão desconhecida à leiga pessoa que vos escreve. Esta é a razão, ele disse, da luminosidade da lâmpada ir ficando mais amarelada com o passar do tempo.

Eu sinceramente não sei se a informação que ouvi de meu pai é verdadeira ou se se trata apenas de alguma sabedoria popular equivocada, mas fato é que com o passar do tempo a luz de uma lâmpada realmente começa a ficar cada vez mais amarelada e, quando você a retira da boquilha (cujo nome predial correto é “receptaco”), você consegue observar uma série de pontinhos de sujeira no entorno da lâmpada.

O engraçado é que o ciclo de vida de cada mosca comum é relativamente pequeno (cerca de oito dias), e mesmo assim sua influência é grande sobre a aparência externa da luz da lâmpada: mosca após mosca, cocô após cocô, a lâmpada vai se amarelando progressivamente.

A certeza sobre a veracidade deste hábito das moscas não é necessário para a analogia que vou propor neste texto. Aliás, a dúvida é até benéfica neste caso.

Quando lemos o livro de Atos percebemos que o Evangelho irradiou clara e fortemente por todo o mundo antigo. A despeito de toda perseguição que os discípulos de Cristo sofreram por parte dos judeus e do Império Romano, o Evangelho brilhou! Sua mensagem continha algo que fazia as pessoas abandonarem todo o conforto que tinham, toda a tradição cultural e religiosa que defendiam, para viver sob o risco de não ver a luz do sol no dia seguinte.

A luz brilhante do Evangelho foi tão forte que cegou o brilhante pensador Saulo de Tarso por alguns dias, e o fez posteriormente considerar tudo o que antes considerava valoroso como refugo (lixo)!

Mas atualmente a luz do Evangelho não brilha mais no mundo como brilhava antigamente. Escândalos e mais escândalos pulam feito pipoca na mídia semanalmente: desde os mais “comuns” como pedofilia, corrupção e desvio até casos mais absurdos, como de pastores contrabandeando armas para traficantes brasileiros.

O problema não está com o Evangelho, como muitos pensam. O problema está exatamente em nós e o que fazemos com ele. Nós, assim como as moscas, sujamos o Evangelho todos os dias com pequenos pontinhos, a ponto de, depois de algum tempo, sua luz não causar mais o mesmo efeito brilhante de outrora. A luz do Evangelho – que antes era irradiante, clara, bela e confrontadora – por causa dos seres humanos começa a ficar (aos olhos do mundo) amarelada, desagradável e fosca.

Será que os grandes avivamentos são os períodos em que Deus limpa a lâmpada do Evangelho, retirando as caquinhas que nós freqüentemente depositamos lá? Como este texto é uma analogia, pode ser. Todo momento de avivamento é precedido por uma forte limpeza da Igreja, onde inevitavelmente muitos a deixam.

As igrejas clamam sobre o “avivamento” do Brasil, mas clamam um “avivamento” que se identifica apenas por números. Um avivamento aos moldes capitalistas: resultados, metas, "prosperidade". A se levar em conta apenas o “avivamento” dos números, as coisas na África devem estar indo de vento em poupa! Há apenas um século atrás menos de 10% da população africana se dizia cristã, hoje este total já alcança 50% da população do continente (D’SOUZA, A Verdade Sobre o Cristianismo, Thomas Nelson, 2008). Que grande avivamento devemos ter lá, não!?

Para acompanhar o “avivamento” africano é só abrir os jornais...

O país pode estar do jeito que estiver: fome, desigualdade, corrupção... nada disso precisa mudar. Não importa se a luz da lâmpada esteja fosca com nossas bostinhas. Basta apenas ao mundo estar aos “pés de Cristo”. Nada mais deve nos preocupar além de “salvar” as pessoas de modo integral a"alma" das pessoas, afinal viveremos mesmo é na Glória, não é?!

A analogia da lâmpada é limitada, sim, a criei em poucos minutos. Mas o importante é que reconheçamos que somos nós (eu e você) aqueles que têm sujado a Lâmpada da Verdade. Neste ponto não há como atribuir culpa a Fulano ou Sicrano: todos nós somos responsáveis por tornar o Evangelho cada vez mais amarelo e sem relevância para a sociedade.

Que Deus nos ajude!


Eliel Vieira
eliel@elielvieira.org

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1 comentários:

Belo texto, Eliel!

Tive a ousadia - e espero não ter sido inconveniente - de colocar esse artigo no meu blog, com os devidos créditos, é claro.

Deus seja contigo.

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