As Origens da Igreja Batista
Talvez os batistas sejam os mais “patriotas” dentre as denominações protestantes.
Porém, poucos batistas conhecem sua história. Em 23 anos de idade (logo, 23 anos batista) não me lembro de um culto ou lição dominical sequer que tenha contado a história da Igreja Batista. De onde surgiu o nome “batista”? Onde eles surgiram? Por que eles surgiram? Por que se chamam assim?
Faça estas perguntas a algum amigo seu batista e a probabilidade será grande dele não saber nenhuma das respostas.
Para entender como surgiu a Igreja Batista, temos que voltar cerca de um século antes de seu surgimento, para o ano de 1517.
Neste ano um frade agostiniano chamado Martinho Lutero afixou na porta da igreja do castelo de Wittenberg um cartaz com 95 teses contrárias à venda de indulgências pela Igreja Católica. As indulgências eram cartas seladas por Roma que garantiam perdão e alívio das penas que a pessoa sofreria no purgatório. Podiam-se comprar indulgências até para aos parentes mortos e aliviar, assim, a dor que eles estavam sofrendo no purgatório.
Lutero então, na noite do dia 31 de Outubro de 1517, afixou as 95 teses. No dia seguinte, 1º de Novembro, todos iriam à igreja, pois seria o Dia de todos os Santos. Todos viram as teses de Lutero e poucos dias depois a Alemanha inteira sabia sobre elas.
As 95 teses de Lutero eram desafiadoras e causaram constrangimento à Igreja na época. Veja algumas:
36 – Qualquer cristão verdadeiramente arrependido tem direito à remissão plena de pena e culpa, mesmo sem carta de indulgência.
82 – Porque o Papa não evacua o purgatório por santíssimo amor às almas e pela suprema necessidade das mesmas, sendo esta de todas as causas a mais justa, já que ele redime inúmeras almas por meio do tão miserável dinheiro para a construção da basílica, que constitui uma causa tão insignificante?
Pois bem, este evento específico desencadeou a chamada “Reforma Protestante”. No final das contas, os cidadãos da Alemanha e de várias províncias da Europa passaram a ter a liberdade para ser católicos ou protestantes (antes, rejeitar os dogmas católicos era crime passível de morte).
Com a “liberdade” religiosa instituída e com a popularização da Bíblia (até então só existiam versões em latim da Bíblia e a leitura dela era permitida apenas aos sacerdotes) vários grupos de cristãos na Europa começaram a rever alguns pontos de sua fé. Dentre estes grupos, surgiram os anabatistas.
Os anabatistas surgiram especialmente nas regiões da Europa de grande descontentamento social. Os grupos de anabatistas eram formados em grande parte por camponeses e artesãos que foram vítimas de injustiças. Muitos deles estavam envolvidos na Guerra dos Camponeses em 1525. Em geral, os anabatistas eram pessoas calmas, devotadas, piedosas, trabalhadoras e que buscavam ficar afastados das lutas políticas. Para os anabatistas a sociedade seria feliz se vivesse conforme os princípios do Novo Testamento, especialmente os ensinamentos do Sermão da Montanha.
As sociedades anabatistas se estabeleceram principalmente na Suiça e nas regiões sul e oeste da Alemanha.
A principal crença destas comunidades era de que o sacramento do Batismo deveria ser ministrado apenas aos adultos, por eles possuírem a capacidade de pensar, decidir e se converter. As crianças, por serem inconscientes de sua fé, não eram aptas a serem batizadas, de acordo com os anabatistas.
É daí que surgiu o nome “anabatista”. Anabatista é aquele que batiza novamente.
Aqueles que se filiavam às sociedades anabatistas eram batizados novamente, pois, o batismo que eles haviam recebido na Igreja Católica, era destituído de significado.
Outros princípios anabatistas eram: a desconfiança em relação a qualquer autoridade secular e às demais igrejas institucionalizadas; e ênfase da experiência da regeneração pelo Espírito Santo mais do que a justificação forense; a propriedade coletiva dos bens; e a ênfase ao pacifismo e à não-resistência.
Por seguir estes princípios, os anabatistas são considerados por alguns historiadores como “a ala esquerda da Reforma”, “reformadores radicais” ou “protestantes do protestantismo”.
Os mais influentes líderes anabatistas foram Meno Simons, Jacob Hutter e Baltasar Hubmaier.
Sob a liderança destes líderes, os anabatistas percorreram toda a Europa pregando a necessidade do arrependimento e da fé pessoal antes do batismo e “rebatizando” católicos e protestantes.
Tal atitude, claro, não agradou a Igreja Católica nem os demais protestantes (luteranos e reformados) que passaram a perseguir os anabatistas. Usando a justificativa que ao negar o batismo às crianças os anabatistas estavam molestando-as, católicos e protestantes começaram a perseguir, julgar e condenar a morte todos os anabatistas.
Félix Manz foi o primeiro mártir anabatista. No dia 5 de Janeiro de 1527, o líder anabatista foi preso e levado à Zurique onde foi julgado e condenado (não por católicos, mas por protestantes) à pena de morte: afogamento. O chamado “terceiro batismo”. Félix Manz foi amarrado e jogado no rio Limmat, em Zurique.
A pena do “terceiro batismo” se tornou a preferida por católicos e protestantes quando condenavam anabatistas. Uma forma de zombar da crença dos anabatistas enquanto eles morriam. Milhares foram mortos desta forma.
Esta perseguição durou décadas até que o movimento “esfriou”.
Vários movimentos ocorreram até que em 1608, um grupo de refugiados ingleses liderado por John Smyth (ex-clérigo anglicano) e Thomas Helwys (advogado) foram para a Holanda em busca liberdade religiosa. Lá eles se encontraram com os anabatistas e organizaram, em 1609, a primeira igreja com doutrinas batistas na cidade de Amsterdã.
Após a igreja batista holandesa estar fundada, Thomas Helwys retornou à Londres e lá fundou a primeira Igreja Batista da Inglaterra em 1611. A partir dali o número de igrejas batistas começou a crescer. Em 1650 já existiam 47 congregações batistas em toda a Europa.
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Acima contei de forma resumida as origens da Igreja Batista. Talvez você não sabia, mas os fundadores desta denominação foram verdadeiros heróis. Pessoas que não tiveram medo de pensar nem de questionar a postura e a conduta de seus líderes.
Os batistas foram os primeiros protestantes que criticaram o protestantismo.
Ser batista é ser contrário à opressão social. Ser batista é ser contrário às interpretações tendenciosas da Bíblia. Ser batista é se preocupar com o bem estar do próximo. Ser batista é buscar na Bíblia o padrão de moralidade que devemos ter.
Ser batista é ser, enfim, o contrário do que as igrejas batistas (em grande maioria) pregam, ensinam e são nos dias de hoje.
Eliel F. Vieira
eliel@elielvieira.org
Bibliografia:
- LUTERO, Martinho. Do Cativeiro Babilônico da Igreja. Tradução de Martin N. Dreher. 1 ed. São Paulo: Martin Claret, 2006.
- NICHOLS, Robert Hastings. História da Igreja Cristã. Tradução de J. Maurício Wanderley. ed. rev. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1979.
- OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. Tradução de Gordon Chown. 1 ed. São Paulo: Editora Vida, 2001.
- MCGRATH, Alister E.. Teologia Sistemática, Histórica e Filosófica. Tradução de Marisa K. A. de Siqueira Lopes. 1 ed. São Paulo: Shedd Publicações, 2005.
- PIBCZ. História dos Batistas. Disponível em: http://www.czs.com.br/pibczs/historia/igreja.htm. Acesso em 26/03/2009.
- SAUSSURE, A. de. Lutero: o grande reformador que revolucionou seu tempo e mudou a história da igreja. Tradução de Anna Hubber. 1 ed. São Paulo: Editora Vida, 2004.
- WIKIPEDIA. Igreja Batista. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Igreja_Batista. Acesso em 26/03/2009.
- WIKIPEDIA. John Smyth. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/John_Smyth. Acesso em 26/03/2009.
- WIKIPEDIA. Thomas Helwys. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Helwys. Acesso em 26/03/2009.

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