sexta-feira, 14 de agosto de 2009

[5/8] Existem Evidências Históricas para a Ressurreição de Jesus?

Parte 5 de 8.

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Dr Ehrman – Primeira Refutação

Obrigado Bill por esta refutação incrível! Mas tenho de dizer que se você pensa que eu vou mudar de opinião apenas porque você tem uma prova matemática da existência de Deus, sinto muito, mas isto não vai acontecer! Então, me desculpe, eu tenho apenas doze minutos para minha refutação e preciso de três horas, como eu imagino que você também precise.

Permitam-me dizer que eu respeito a fé pessoal de Bill de que Jesus ressuscitou de dentre os mortos, mas eu penso que sua reivindicação de que esta fé possa ser provada historicamente é falsa. Eu vou dividir minha resposta em quatro partes, apresentando aspectos duvidosos da apresentação de Bill, dando exemplos ao invés de tentar lidar com cada detalhe desta apresentação.

Primeiro, Bill faz uso duvidoso das menções de autoridades modernas. Bill freqüentemente cita estudiosos modernos como se de alguma forma estas citações constituíssem evidência para seu ponto de vista. Como o próprio Bill sabe, o fato da maioria dos estudiosos do Novo Testamento concordar com seus quatro pontos não prova que eles estão corretos. Por uma simples razão: a maioria dos estudiosos do Novo Testamento acredita no Novo Testamento, isto é, eles estão comprometidos com o texto, então eles obviamente vão concordar com os quatro pontos. Eu poderia mencionar aqui que a maioria dos historiadores não concorda com a conclusão de Bill. Isto torna suas conclusões falsas? Não. Isto simplesmente significa que suas conclusões não são persuasivas para a maioria dos historiadores. Tendo dito isto, estou surpreso com algumas das autoridades que Bill menciona, porque na realidade a maioria dos estudiosos críticos que pesquisa sobre a história de Jesus discorda da conclusão de Bill de que um historiador pode mostrar que o corpo de Jesus imergiu fisicamente de sua tumba. Bill pode até se surpreender com isto e a razão é o contexto onde ele trabalha – um seminário evangélico conservador. Neste ambiente, o que ele pronuncia não é nada mais do que todo mundo acredita. E é impressionante como até mesmo algumas das autoridades chave que ele citou não concordam com suas conclusões. Ele cita um bom número de estudiosos, que eu considero como amigos e conhecidos, e eu posso dizer a vocês, eles não concordam com seu ponto de vista. Isto o torna errado? Não, isto simplesmente significa que sua impressionante lista de citações é tendenciosa, parcial, e falha na tarefa de nos contar a história real, que é que ele representa a opinião minoritária no debate.

Segundo, Bill faz uso duvidoso das fontes primitivas. Bill cita o apóstolo Paulo sobre José de Arimatéia ter enterrado Jesus, apenas para pegar um exemplo, como uma fonte datada apenas cinco anos após a morte de Jesus. Paulo não estava escrevendo cinco anos após a morte de Jesus; ele estava escrevendo vinte e cinco anos depois, e nunca mencionou José de Arimatéia. José de Arimatéia não é citado até que você chegue ao evangelho de Marcos, 35 ou 40 anos após o fato. Quando Paulo menciona que Jesus foi sepultado, ele quer dizer que ele foi sepultado em uma caverna comum, o que freqüentemente acontecia com criminosos crucificados. Paulo disse que ele foi sepultado; ele pode ter sido sepultado em uma caverna comum. Devo frisar que em alguns de seus trabalhos, Bill cita um grande número de frases minhas, e ele as tira fora de seu contexto, como mostrarei em alguns minutos, porque o que ele disse sobre eu ter mudado de idéia, eu não concordo. Mas em seus escritos ele menciona que Marcos trás uma narrativa mais simples sobre o sepultamento e que, por esta razão, seu relato se trata de uma narrativa não adulterada por alterações e então, segundo suas palavras, mais provável de ser histórica. Eu gostaria de saber se ele ainda pensa assim – que uma tradição não adulterada é mais provável de ser histórica. Porque se isto for verdade, então eu gostaria que ele nos dissesse se ele pensa que o relato de Mateus não é histórico, por ser a tradição mais adulterada de todas. Isto pode ser comparado com seu comentário alguns minutos atrás de que todas as tradições primitivas concordavam com alguma coisa, então que nós não deveríamos nos preocupar com as a tradições posteriores. Bem, então, nos diga Bill, você acha que as tradições posteriores não são históricas?

Terceiro, Bill faz reivindicações e asserções duvidosas. Por exemplo, Bill diz que a história das mulheres indo à tumba jamais poderia ter sido inventada pelos primeiros cristãos. Devo frisar que Paulo jamais mencionou as mulheres indo à tumba, apenas os relatos posteriores de Marcos e demais evangelhos. Aqui o problema é um dentre outros típicos da posição de Bill. Seu argumento não analisa seriamente a natureza das fontes. Qualquer um que analisasse o evangelho de Marcos não teria nenhuma dificuldade de ver porque, 35 anos após o evento, ele ou qualquer outra pessoa em sua comunidade poderia ter inventado esta história. O evangelho de Marcos é cheio de reflexões teológicas sobre o sentido da vida acerca de Jesus; este é o evangelho de Marcos. Ele não é um relatório, é um evangelho. É uma proclamação das boas novas, como Marcos mesmo disse, da morte e ressurreição de Cristo. Um dos temas abordados por Marcos é que nenhuma pessoa durante o ministério de Jesus conseguiu entender quem ele era. Sua família não entendeu. Seus conterrâneos não entenderam. Os líderes de seu povo não entenderam. Nem mesmo seus discípulos entenderam Jesus – especialmente os discípulos! Para Marcos, apenas os estrangeiros tinham um palpite de quem Jesus era: uma mulher desconhecida que o ungiu, um centurião, etc. Quem entendeu quem ele era no final das contas? Nem a família de Jesus, nem os discípulos! Apenas um grupo de mulheres desconhecidas. Por outro lado a narrativa das mulheres à tumba se encaixa perfeitamente com os propósitos do evangelho de Marcos. Desta forma, elas não podem ser tomadas como uma espécie de evidência histórica para o fato. Elas claramente se encaixam na “agenda” do evangelho. O mesmo pode ser dito sobre José de Arimatéia. Qualquer um que não consiga pensar porque os cristãos podem ter inventado a idéia que Jesus tinha um seguidor secreto entre os líderes judeus está simplesmente em falta com a imaginação histórica.

Quarto, Bill faz inferências duvidosas em seus argumentos. Bill infere que Paulo deve ter acreditado na tumba vazia uma vez que ele falou sobre as aparições de Cristo. Cristo apareceu, então a tumba vazia deve ser verdade. Este é um ponto de vista muito problemático. Para os antigos, como em oposição a pensadores pós-iluministas com Bill, uma aparição não requer necessariamente uma reanimação do corpo físico. De acordo com os evangelhos, Moisés e Elias apareceram a Jesus, Tiago e João. Você acredita que estes homens, Moisés e Elias, voltaram à vida? Aquele corpo de Moisés foi reconstituído, voltou da morte e então apareceu vindo dos céus? Ou aquilo foi uma visão apenas? Certamente foi uma visão; Moisés e Elias desapareceram imediatamente. As pessoas antigamente não tinham problema em acreditar que os corpos podem ser espirituais, não físicos. Evidências para isto podem ser encontradas abundantemente em todas as fontes antigas – judaicas, pagãs e cristãs. Fontes pagãs do oitavo século ao segundo século anterior a Cristo; de mitos pagãos a romances pagãos a poetas pagãos a filósofos pagãos, eles estão repletos de relatos de Deus aparecendo na forma humana aos seres humanos. Mas estas aparições são visões; não corpos humanos reais. O divino pagão Apolônio de Tiana aparece a seus seguidores após sua morte, mas trata-se de uma visão, não de uma reanimação de seu corpo. Com textos judeus da mesma forma: anjos, arcanjos e demônios aparecem às pessoas em imagem humana, mas eles não possuem corpos reais.

Em resumo, Bill erra ao assumir que se os discípulos afirmaram ter visto Jesus vivo após sua morte, eles necessariamente acreditaram ou sabiam que se seu corpo físico havia ressuscitado. A presunção de Bill é moderna, não antiga. Os textos com os quais estamos lidando são textos antigos, não modernos. As pessoas de antigamente não tinham absolutamente nenhuma dificuldade de pensar que uma aparição divina não era física. Um corpo poderia ser sepultado e a pessoa poderia aparecer viva logo em seguida sem que seu corpo deixasse a tumba. Se Bill tem dúvidas quanto a isso, eu sugiro a ele que leia mais alguns textos antigos para que ele veja como eles tratam disto. Ele pode começar com os textos cristãos do século segundo, como Atos de João ou Apocalipse de Pedro ou o Segundo Tratato de Seth, ou ele pode considerar os argumentos propostos por Basílides, que foi discípulo de Pedro. Para as pessoas daquela época, aparências post-mortem não eram sinônimos de reanimação de corpo.

Além do mais, o corpo de Jesus ressuscitado podia fazer coisas que corpos comuns não podem fazer. Ele entra em salas que estão com as portas trancadas por dentro, ele ascende aos céus. Bill está seriamente argumentando com bases históricas que o corpo ressurreto de Jesus poderia fazer estas coisas? Trata-se de afirmações teológicas sobre Jesus, não de uma afirmação histórica. Historiadores não são aptos a estabelecer o que Deus faz. Este é o trabalho de um historiador. O mesmo acerca de sua conclusão de que Deus ressuscitou Jesus dos mortos. Trata-se de uma conclusão teológica, não histórica. Se ele quer juntar evidências matemáticas sobre o que Deus provavelmente fez no mundo, eu devo dizer que isto não vai convencer à maioria dos matemáticos e certamente não vai convencer a maioria dos historiadores. Historiadores não têm acesso a Deus. O historiador pode dizer que Jesus morreu na cruz, mas ele não pode dizer que Deus aceitou seu corpo como uma expiação. O historiador pode dizer que o apóstolo Paulo afirmou ter tido uma visão de Jesus após sua morte, mas ele não pode dizer que Deus ressuscitou Jesus dentre os mortos.

A verdade é que: nós não sabemos se Jesus foi sepultado por José de Arimatéia. O que nós temos são relatos escritos décadas depois dos eventos por pessoas que ouviram histórias em circulação, e não é de maneira nenhuma difícil imaginar alguém inventando esta história. Nós não sabemos se a tumba de Jesus estava vazia três dias depois. Nós não sabemos se ele foi visto fisicamente pelos seus seguidores após sua morte. Bill vai dizer que eu contradisse a mim mesmo, mas eu gostaria de lembrar que mais cedo ele me elogiou por ter mudado de opinião!

Eu tenho três questões conclusivas para Bill. Se Bill está reivindicando ser um historiador, então eu acho que é importante avaliar sua relação com os documentos históricos nos quais ele está apelando. Bill acha que os evangelhos dos quais ele está retirando suas informações possuem muitos erros? Se sim, ele poderia nos dizer dois ou três destes erros? Se não, como ele pode esperar que nós acreditemos que ele esta avaliando historicamente estas fontes? Por causa de seus pressupostos prévios, estes textos têm de estar corretos.

Segunda questão: Bill acredita que pode ser mostrado historicamente que Jesus realizava milagres, especialmente sua ressurreição, mas também os milagres de sua vida, sem dúvida. Eu gostaria que ele discutisse sobre as evidências em relação aos outros realizadores de milagres contemporâneos de Jesus aparte da tradição cristã. Estaria ele disposto a admitir a partir das mesmas bases históricas que estas pessoas realizaram milagres? Estou me referindo à tradição dos milagres realizados por “Apolônio de Tiana”, “Hanina ben Dosa”, “Honi, o desenhista de círculos”, “Vespasiano”. Estaria Bill disposto a reconhecer que Apolônio apareceu aos seus seguidores após sua morte ou que Otaviano ascendeu aos céus? Ou ele pode pegar qualquer outro milagreiro das tradições pagãs que ele escolher.

Terceira, e finalmente, se apenas os milagres que Bill aceita como tendo acontecido são aqueles pertencentes à tradição judaico-cristã que ele próprio professa, eu gostaria que ele nos dissesse o que os faz ser históricos. Como a fé que ele adotou ainda na adolescência pode ser a única que tem credibilidade histórica? Foi simples coincidência o fato de ele ter nascido em uma família religiosa ou em uma cultura religiosa que pode ser demonstrada historicamente como a única religião verdadeira?


Clique aqui para ler a parte 6

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Traduzido por Eliel Vieira
eliel@elielvieira.org

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DESCONSTRUINDO por Eliel Vieira está licenciado sob Creative Commons Attribution.



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