quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Resposta a Glauber Ataíde: Verdades, Mentiras, Comunismo e Cristianismo

Tenho conversado muito ultimamente com Glauber Ataíde, um amigo virtual que conheço há alguns anos, cuja inteligência sempre me foi de alguma forma útil. As conversas que tenho com ele quase sempre são bem agradáveis, mas, claro, como em qualquer tipo de relação entre duas pessoas, existem divergências de opiniões sobre determinados assuntos.

Antes de apresentar minha resposta a Glauber sobre a questão debatida na manhã/tarde de 16/09/09, vou contextualizar você, leitor, sobre quem é Glauber Ataíde, sobre o que conversamos e o que começou a última discussão que tivemos.

Conheci Glauber quando ele ainda era cristão, apologista, daqueles que entram em discussões e debates no intuito de defender a fé. O prosseguindo das leituras de Glauber o conduziu para uma posição que não sei mais qual é. Talvez ele ainda seja cristão, talvez não. Fato é que seus interesses intelectuais não repousam mais sobre assuntos relacionados à religião, à Bíblia, à Teologia, etc. Mas é facilmente notável que, apesar de todo o ceticismo de seus interesses intelectuais, Glauber não perdeu sua espiritualidade. Ele é apenas um questionador e, como a fé não dá margem para ser questionada (não penso assim, mas talvez esta seja a visão dele), a fé deixou de ser objeto de seu estudo.

Como ex-apologista, freudiano e comunista, Glauber sente uma completa repulsa por aqueles apologistas que consideram o freudismo ou o marxismo como meras fraudes, apenas porque Freud e Marx eram ateus. Tenho quase certeza que a percepção de posturas como esta foram um dos motivos que contribuíram para que Glauber buscasse se afastar de tudo aquilo que antes ele defendia. Glauber tem vergonha de ser relacionado com o tipo de impostura intelectual utilizada por muitos cristãos. E eu o entendo. Para dizer a verdade eu mesmo tenho grande vergonha de dizer que sou evangélico dentro de um círculo de pensadores.

Enfim, chega de introduções. Para quem quiser conhecer mais sobre Glauber e seus pensamentos, faça uma visita a seu blog e leia o rico conteúdo que lá se encontra.

Pois bem, o debate que tivemos recentemente se focou exatamente nesta questão de algumas pessoas, por já terem a “verdade”, desconsiderarem os pensamentos “rivais” apenas porque são rivais. O exemplo usado por Glauber foi o de o dono de um blog apologético ter o censurado por ser freudiano e comunista. Glauber o perguntou se ele havia lido Freud ou Marx e o dono do blog disse a ele que não havia motivos para desperdiçar seu tempo com este tipo de leitura. Glauber chamou esta postura de “Filosofia Tabajara”.

E foi aqui que fiz um comentário que gerou o debate que tivemos. Glauber não mencionou em seu texto, mas eu deixei claro a ele em nosso diálogo que eu não defendo este tipo de postura dos cristãos que o censuraram. O ponto que eu defendi foi outro: o mesmo Glauber que reclama dos cristãos que estabelecem julgamentos sobre Freud sem antes lerem-no, age da mesma forma em outros momentos. O exemplo usado por mim foi o da relação do Companheiro Glauber e as publicações burguesas.

Recentemente algo interessante aconteceu. Glauber postou um link de uma matéria sobre Hugo Chavez publicada no sítio eletrônico do PCdoB. Eu, em resposta, perguntei a ele se ele defendia Chavez fazendo algum trocadilho com sarcasmo. A resposta de Glauber foi na verdade um pergunta: “qual são suas fontes sobre Chavez?”. Então eu o disse que era a revista VEJA, tão odiada pelos comunistas. Glauber, então, limitou-se a dizer que “a VEJA não vê nada”.

Ora! É exatamente isto o que estou falando. Glauber agiu exatamente como o apologista que se negou a considerar Freud e Marx sem ter os lido. Vamos lá: Glauber é comunista. Como todo bom comunista, Glauber acredita que o capitalismo é um sistema selvagem que escraviza o proletariado, que a mídia é vendida aos “golpistas de direita”, e, claro, que toda informação anticomunista divulgada por meios de comunicação como Globo e VEJA são nada mais do que tentativas “burguesas” de continuar manipulando a mente das pessoas para que elas não enxerguem a condição social em que vivem.

Sendo assim, o que se espera de uma mídia golpista de direita? Ora, espera-se que ela fale mal mesmo dos comunistas, dos companheiros, das lutas sindicais, de Cuba, de Chavez, das FARC, etc. Porém, como eu mostrei a Glauber, este pensamento impede que um comunista (por mais honesto intelectualmente que ele seja) reconheça que veículos de comunicação como Globo e VEJA digam algo anticomunista que seja verdadeiro, mesmo que o que seja apresentado seja de fato verdadeiro.

Imaginemos um exemplo hipotético: imaginemos que um dos filhos de Hugo Chavez comece a discordar de seu pai e comece a armar um motim contra seu pai. Chavez descobre a trama e então decide forjar a morte de seu filho por envenenamento. A trama é bem organizada e ninguém desconfiou que Chavez envenenou e assassinou seu filho. Porém, entre os conselheiros de Chavez, encontra-se uma pessoa infiltrada da revista VEJA e ele envia todas as informações para o Brasil para serem divulgadas. Trata-se de um acontecimento puramente hipotético. Eu não estou dizendo que Chavez é o tipo de pessoa que faria uma coisa destas. Eu nem sei se Chavez tem filhos. É apenas uma história fictícia para exemplificar meu ponto.

A revista VEJA então é lançada. Matéria de capa: “Chavez envenena e assassina seu filho!”. Você leitor, principalmente se for comunista, o que você pensaria após dar uma primeira olhada na revista? Eu tenho quase certeza que o pensamento seria algo como “Lá vem a mídia golpista, ta vendo? Olha que absurdo eles inventaram desta vez! Estão fazendo de tudo para levar a opinião pública contra Chavez e nem respeitam o luto da família!”. Aí apareceria Chavez na TV para seu pronunciamento semanal e, como se esperaria de qualquer patife que assassinasse seu filho, ele estaria em prantos, dizendo que ele era um bom filho e que as mensagens da “mídia golpista” servem apenas para mostrar que ele sempre esteve certo, etc.

Agora, quem pode dizer que coisas semelhantes em proporção menor já não ocorreram? Que tremenda coincidência o fato das fontes confiáveis serem sempre comunistas e, ainda, que as fontes que apresentam críticas ao mesmo são sempre burguesas, não!?

Portanto, Glauber, acredito que você – como comunista, não em relação a tudo – age exatamente da mesma maneira que o apologista agiu com você quando o censurou porque você é leitor de Freud e Marx. Os caminhos são os mesmos:

- Sou cristão -> Marx e Freud negaram minha fé -> não há nada que preste nos autores ateus -> não devo levar o que eles escreveram a sério.
- Sou comunista -> VEJA é contra minha ideologia -> não há nada que presta em escritos burgueses -> não devo levar o que a VEJA escreve a sério.

O caminho é praticamente o mesmo.

Agora, algumas coisas devem ser deixadas bem claras aqui:

Primeiro, eu não defendi (nem no debate, nem deste texto) a postura daqueles que estabelecem opiniões sobre alguém sem ler e analisar o que este alguém disse. O que eu fiz foi questionar o que você disse à luz de uma “prática” que eu enxergo entre os comunistas em geral. Talvez você seja uma exceção, não sei. Talvez você fizesse questão de comprar a revista VEJA com a notícia de que o Chavez matou seu filho, e ainda pensando que eles poderiam estar falando a verdade. Mas, até onde eu conheço o comunismo e seus adeptos, eles (partindo de seus pressupostos) não analisariam a matéria da VEJA antes de dar seu veredicto de que ela é falsa.

O meu ponto é que, partindo de nossos pressupostos, a análise de alguns escritos contrários soará infrutífera. Você, como comunista, acha que a leitura da VEJA é algo completamente infrutífero. O apologista, como cristão, acha que a leitura de Freud é algo infrutífero pelos motivos dele. A questão é: por que você estaria correto e ele não?

Eu não defendi, Glauber, a posição do apologista. Eu questionei sua crítica a ele à luz de uma prática comum à maioria dos comunistas, sendo você mesmo um comunista.

Segundo, nosso debate não foi sobre capitalismo vs. Comunismo ou sobre livre-mercado vs. Estado maior. Não! Nós já tivemos este debate outro dia e, admito, parte dos meus pensamentos sobre o marxismo estava viciada. Seus argumentos até me deixaram mais a vontade para pesquisar sobre o assunto, ler os originais, etc. Coisa que, aliás, pretendo começar a fazer.

Terceiro, nosso debate não foi religioso. Seu texto deixa transparecer (pelo menos esta foi a impressão que tive) que nossa discussão foi relacionada à religião, e não foi! Aliás, mais especificamente agora sobre o texto que você escreveu, eu encontrei umas informações viciadas ali. Não houve estagnação do pensamento filosófico e científico entre o século V e o século XVI (período de mil anos ao qual você se refere). A Igreja, na verdade, representou até um papel de proteção à Filosofia após a invasão dos bárbaros em Roma no século V. Diga, se a Igreja não tivesse tomado conta da Filosofia logo após as invasões bárbaras, o que teríamos de Filosofia hoje?

Claro, perseguições e retaliações aconteceram e isto é lamentável. Mas, como argumenta Rubem Alves em seu esplêndido livro “Filosofia da Ciência”, não foi o sentimento religioso que foi a causa da intolerância para com quem pensava diferente, foi o dogmatismo científico. Alves argumenta que o mesmo dogmatismo científico existente hoje existia no passado, a diferença é que ele se encontrava em outro lugar. E, se houve estagnação de pensamento por parte da Igreja, a libertação desta opressão de pensamento surgiu de dentro dela mesma, através de Lutero.

Enfim, podemos voltar à questão, caso queira. Neste debate eu estou apenas perguntando, e minha pergunta, para lhe refrescar a memória, é: por que um comunista está justificado se desconsiderar uma matéria da revista VEJA antes de a ler e um apologista não está justificado em desconsiderar uma obra ateísta sem a ler?


Eliel Vieira
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terça-feira, 15 de setembro de 2009

Uma Experiência Interessante: Sobre a Música Cristã (Antiga e Contemporânea)

Todos que me conhecem sabem que sou, assumidamente, um crítico fervoroso dos (des)caminhos adotados pela músicos evangélicos atuais Como já disse em outros textos presentes neste blog, falta à música cristã atual a simplicidade e a beleza que podemos encontrar, por exemplo, nos salmos. Estou tão desiludido a este ponto que atualmente acredito que exista uma relação intrínseca entre “música evangélica atual” e “ruindade”, apesar, claro, de existirem algumas poucas (e boas) exceções.

Algumas pessoas, no entanto, dizem que o que eu tenho na verdade é preconceito. Minha namorada, por exemplo, por mais de uma vez já me disse que eu sou “muito crítico” e que analiso as coisas com conceitos pré-estabelecidos. Segundo a opinião subliminar dela, eu considero a música evangélica atual ruim não porque ela seja necessariamente ruim, mas simplesmente porque ela é “atual”. Do mesmo modo, eu consideraria as músicas velhas “boas”, não por serem “boas” de fato, mas por serem antigas e por não serem do gosto da maioria das pessoas.

Esses comentários são feitos entre nós em conversas esporádicas sobre a questão da musicalidade evangélica, e, confesso, o que ela disse até tem um pouco de lógica. Eu, de fato, tendo a gostar mais das coisas que a maioria das pessoas não gosta. O porquê exatamente eu não consegui identificar ainda, mas eu sinceramente tenho a tendência de rejeitar tudo o que é “popular” (a não ser música popular brasileira que, para dizer a verdade, já não é mais popular), especialmente tudo o que os jovens da minha idade de hoje em dia acham “legal”. E isso não é apenas em relação à música, mas filmes, livros, hábitos, enfim, se me deparo com duas coisas para serem analisadas eu naturalmente tendo meu gosto para aquilo que não é “legal” para o gosto da maioria.

Então, sabendo deste meu “defeito”, estava até pensando: será que eu tenho pré-conceitos sobre a música evangélica? Será que eu não gosto delas apenas porque elas são “atuais”?

No último domingo (13/09/09) aconteceu algo muito interessante na igreja onde eu freqüento que me ajudou a responder a esta questão. Antes de contar o que aconteceu, devo situar você no contexto do culto desta igreja. Na igreja onde eu freqüento o “período de louvor” é curto – geralmente três músicas – e não há outros instrumentos além de violão e (algumas vezes) guitarra, além da voz dos que cantam. Não há bateria, baixo nem teclado, apenas violão e voz. Lá, também, a maioria das músicas tocadas é “atual” (músicas de cantores e grupos evangélicos como Fernandinho, A-pá-sentar, uns plágios do Hillsong United, etc) e músicas velhas nunca foram tocadas lá (pelo menos não nestes quase um ano que estou lá). Porém, as músicas são executadas apenas em violão-voz, o que,dificultaria muito a diferenciação entre estilos atuais e antigos (as batidas de bateria são as diferenças mais identificáveis entre músicas de diferentes eras).

No último domingo (13/09/09), após a pregação, algo diferente aconteceu. O pessoal do “louvor” começou a tocar uma música que ainda não tinha ouvido lá. Aliás, eu nunca a tinha ouvido em minha vida, e a letra, para meu espanto, era belíssima. Leia a letra da música:

Ó meu Criador,
Quando grande amor Tu tens por nós
Ao ponto de morrer na cruz para nos salvar.
O homem não quer reconhecer.

Ó Jesus, quase ninguém fala de Ti,
Meu Senhor.
Parece que te esqueceram
Não querem mais saber de Ti
Nem de Ti ouvir falar.

Mas, Jesus, falo de Ti
Mesmo não sendo ouvido.
O Teu amor é muito grande
Tu sabes que eu preciso de Ti
Eu sou Teu, sim, sou só Teu.

Como eu nunca tinha visto uma música velha sendo executada lá e, ainda, sabendo que o povo lá gosta mesmo é das músicas evangélicas atuais, pensei: “Puxa! Até que enfim algum cantor evangélico compôs algo que presta!”.

Então, após a execução da música, virei para minha namorada e perguntei a ela: “Está música é de quem?”.

Sua resposta: “Ela nunca foi gravada. É de um compositor antigo aqui da Igreja, o irmão Jackson”.

Estava explicado! A música era velha, eu apenas não a havia identificado porque, até onde eu sabia, apenas músicas evangélicas recentes eram tocadas na igreja. Mas como fui me iludir! Uma música tão bela assim ter sido composta pelos grupos evangélicos (ou seriam EU-vangélicos?) atuais era bom demais para ser verdade.

Esta experiência serviu para mostrar que, ao contrário do que minha namorada dizia e que eu estava quase me convencendo ser absolutamente verdade, eu não acho que as músicas atuais evangélicas sejam ruins apenas porque são atuais. Não! Eu acho que elas são ruins porque elas de fato são ruins! Eu achei linha a letra da música diferente que eu ouvi no domingo, mesmo pensando que ela era uma música atual, gospel, ou sei lá como se chama.

Acho que esta experiência é uma forte evidência de que eu e todos os críticos da música evangélica atual estamos certos em criticar a falta de criatividade, beleza e simplicidade das músicas evangélicas atuais. É triste ver o caminho que os evangélicos decidiram tomar. Pelo menos ainda temos as músicas velhas...


Eliel Vieira
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sexta-feira, 11 de setembro de 2009

As Desventuras de Malafaia

Primeiro vídeo produzido pelo blog DESCONSTRUINDO.



Divulguem!


Eliel Vieira
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segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Resenha: Em Defesa da Fé - Lee Strobel

Lançado no Brasil em 2002 pela Editora Vida, o livro Em Defesa da Fé é mais uma boa ferramenta para aquelas pessoas que se interessam em debates e leituras apologéticas. Escrito pelo jornalista ex-ateu Lee Strobel, Em Defesa da Fé é muito característico e particular em sua estrutura, não sendo apenas mais uma obra apologética dentre as inúmeras existentes.

O livro, bem dizer, não foi todo escrito por Strobel. Seguindo a linha do primeiro livro do autor – Em Defesa de CristoEm Defesa da Fé foi criado a partir de entrevistas que Strobel fez com alguns dos mais famosos apologistas cristãos da atualidade. Mas isto não tira os méritos do autor na obra. Muito pelo contrário, conseguimos perceber claramente a grande habilidade de Strobel em trabalhar com as palavras e em elaborar perguntas perspicazes na busca de conseguir as melhores respostas.

A proposta de Strobel em Em Defesa da Fé é responder às objeções que as pessoas têm em relação à fé cristã. Para cada objeção, um apologista foi entrevistado por Strobel.

Não vou mentir: o livro tem seus pontos fracos. A meu ver as entrevistas de Walter L. Bradley (sobre a teoria da evolução) e Norman Geisler (sobre as passagens da Bíblia nas quais Deus teria mandado matar pessoas inocentes) são pontos fracos da obra. Walter Bradley concentra suas críticas contra a teoria da evolução em argumentações sobre ignorância (a ciência não sabe como X aconteceu, logo X tem de ter acontecido pela interferência de um Designer) e Geilser, já comprometido como pressuposto de que a Bíblia é porque é um livro 100% inerrante, tentou prover respostas para as passagens “polêmicas” da Bíblia, claramente adequando-as ao seu pressuposto. Muitas das respostas de Geisler não me convenceram e, certamente, não vão convencer os ateus que lerem esta obra.

Porém, mesmo nestas entrevistas que considerei “ponto fraco” do livro, algumas boas respostas foram dadas por estes apologistas entrevistados. Além disto, o livro tem seus pontos fortes.

Os destaques são as entrevistas de Peter John Kreeft sobre o famoso problema do mal (suas respostas foram muito boas), William Lane Craig sobre a possibilidade de ocorrências de milagres (Craig, novamente, mostrando toda sua habilidade retórica), Ravi Zacharias (com reservas, algumas de suas respostas não me agradaram) sobre a particularidade cristã em relação às demais religiões e J. P. Moreland sobre o problema do inferno. A entrevista de Moreland, penso, a melhor de todas as entrevistas do livro.

Os textos escritos exclusivamente por Strobel – a introdução e a conclusão de cada capítulo e do livro – são textos muito bons, apesar de serem muito de escrita bem “apaixonada”, de caráter bem evangelístico, o que pode não agradar aos leitores ateus que venham a ler esta obra.

Enfim, tenho minhas reservas em relação a esta obra (como tenho com praticamente todos os livros que leio), mas, no fim, é uma boa ferramenta para quem gosta de ler sobre questões apologéticas. É importante destacar que Em Defesa da Fé é um livro mais introdutório à prática apologética que, penso, trará pouca novidade a você que já está acostumado a ler obras apologéticas mais extensas. Apesar de trazer poucas novidades, muitas questões interessantes são abordadas, e é um livro que valeu a pena ler – apesar de não saber se virei a tirá-lo da prateleira outra vez.


Eliel Vieira
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domingo, 6 de setembro de 2009

Resposta a Robson Cota: Sobre os Católicos e o Ecumenismo

Mensagem 1: Você tolera o ecumenismo?

Acha mesmo que os católicos servem ao mesmo Deus que os cristãos? Acha mesmo que eles clamam ao mesmo Jesus que é o Filho de Deus e encarnou?

Cristão é aquele que entregou sua vida a Cristo e segue a verdade dEle. Você acha que os católicos se enquadram nessa categoria?

A união que prega a Bíblia é a união promovida pela VERDADE. Só a verdade une. Em nenhuma passagem há alguma sugestão do tipo "se não pode com eles, junte-se a eles". Ecumenismo não é ensinado na Palavra de Deus.

Não estou dizendo que não há salvação fora dos protestantes, nem fazendo apologia a denominações. Mas para que teimar em encontrar cristianismo em um lugar que é óbvio que não tem?

E tem outra: a pregação não é por sabedoria de Palavras, mas é poder do Espírito. Os católicos podem falar tudo o que é verdade sobre Filipenses, mas isso será sabedoria de Palavras ou poder do espírito? Não digo que você é melhor do que eles e por isso não deve se misturar, só digo para não chamar "bom" o que Deus já disse que é "mau".

Mensagem 2: Oi, amigo, vi sua carta lá pro Malafaia, gostei da iniciativa. Tanto que, já que você parece ser um defensor da fé, fui ao seu blog, vi o seu outro post sobre ecumenismo, e comentei.

Você vendo o comentário pode achar que eu sou mais um fanático fundamentalista belicista, e que por isso eu seja farisaico, já que parece que eu ainda não tenha "amor" ao ponto de me unir com os católicos.

Vendo o seu relato sobre o bom estudo que tiveram sobre Filipenses, não duvido nada de que tenha sido proveitoso. Se você gostou, não deve deixar de voltar, porque de qualquer maneira é a Palavra de Deus. Mas, amigo, não é porque uma religião se diz cristã que ela é cristã de fato.

Se você os chama de "irmãos católicos", automaticamente admite que eles estão no mesmo corpo de Cristo que você, que eles vivem a mesma vida transformada que você. Não estou dizendo que os cristãos devem ser exclusivistas, mas eles não devem aceitar que as heresias invadam o corpo de Cristo. Isso eu sei que você compreende, já que fez aquela carta.

Se você admite que eles são seus "irmãos em Cristo", então eles não precisam mais ser evangelizados! Se você admite que não há nenhum problema com eles, que eles somente representam uma corrente teológica diferente, então não há mais verdade nas palavras de Jesus. Se você olhar o NT atentamente, observará que Paulo, João, Pedro, Judas gastam metade do tempo só falando para vigiar contra as falsas doutrinas, os falsos mestres. Ou seja, Deus não tolera heresias.

O ecumenismo é perigoso, pois leva-nos a tolerar as heresias. Nós não devemos entrar em guerra verbal contra eles, devemos respeitá-los, mas nunca lhes negar o evangelho. O ecumenismo é uma estratégia muito eficaz do inimigo para minar a igreja de Cristo por dentro. Porque a igreja se sustenta pela verdade que ela carrega. Se admitirmos que há outras verdades, então pra quê lutamos por Cristo?

Olha, realmente, como você disse no seu post, há aqueles crentes que se acham super-santos, e ignoram qualquer outra opinião diferente. Isso é lamentável. Um efeito colateral do cristianismo é achar que somos melhores que os outros. Mas esse efeito colateral só atinge aqueles que não compreenderam a mensagem do evangelho, que é a de que todos carecem da glória de Deus, e que Deus nos dá a graça da salvação não porque somos bons, ou porque somos melhores que o vizinho, mas por favor imerecido. Porém, o erro de alguns não é motivo para aceitar o outro erro dos católicos.

Então, o fato de ser bem recebido por católicos na igreja de Lourdes (passo lá perto todos os dias) não deve ser motivo achar que eles professam o amor de Cristo. O amor que é tanto apregoado na Bíblia não é o amor PP (permissivo e pernicioso), é um amor pelas almas perdidas tão grande, tão grande, que nós devemos defender a fé ferrenhamente, para que as almas não seja perdidas pelos enganos do inimigo. Então, se você os ama, deve amá-los como pecadores que precisam de Jesus, não amá-los para se juntar a eles em comunhão, tolerando as suas heresias.

Paz e Abraço!


RESPOSTA:

Caro Robson,

Primeiramente, obrigado pelos seus comentários. Apesar de ser alguém que discordou e criticou um texto meu, apreciei seus comentários. Aliás, eu (ao contrário do Silas Malafaia) fico muito feliz quando recebo comentários de pessoas que discordam de meus textos. Isto mostra que o meu texto intrigou as pessoas, que o texto instigou as pessoas a pensar. Mas vamos aos seus comentários.

Nota-se, pela quantidade de comentários e de recados que você me enviou, que você realmente ficou muito incomodado com o fato de eu aderir ao ecumenismo. Sua primeira mensagem chegou a conter até um pouco de revolta. Isso ficou muito visível nas palavras usadas. Você perguntou se eu “tolero” o ecumenismo, como se isso fosse um terrível mal, como se fosse algo que todo cristão devesse se evitar. Na outra mensagem enviada você foi mais comedido, como que tentando evitar a imagem “fundamentalista” presente em sua primeira mensagem.

Enfim, eu concordo com algumas de suas preocupações levantadas, mas discordo de outras. Ao longo desta resposta vou tentar responder a você satisfatoriamente.

Para começar, devo dizer que você tem um conceito MUITO errado do que é ecumenismo (perceba que o Lourival, que comentou no mesmo texto que você, faz a mesma confusão que você fez). Você claramente confunde ecumenismo com sincretismo. Você diz que “em nenhuma passagem há alguma sugestão do tipo ‘se não pode com eles, junte-se a eles’” e “o ecumenismo é perigoso, pois leva-nos a tolerar as heresias”. Ora, vejamos se isto é verdadeiro. Vamos pegar meu exemplo: eu participei de uma reunião ecumênica com católicos e, contrariando suas preocupações, em momento algum, eu comecei a acreditar que a mãe de Jesus merece adoração ou que os santos do passado fazem intercessão entre nós e Deus. É o sincretismo que prega que devemos acomodar nossas crenças com as crenças de outros grupos para que haja uma união, o ecumenismo prega (do contrário) que, em vista de objetivos comuns, devemos deixar as diferenças teológicas periféricas de lado. O que Constantino fez no século IV foi sincretismo, ele maquiou a fé cristã para que ela se acomodasse com as religiões pagãs de sua época e, assim, conquistasse mais adeptos; o que os teólogos da prosperidade fazem quando associam a fé cristã com princípios capitalistas é sincretismo, pois eles relacionam a fé com as heresias, para objetivo da fé (???). Agora, católicos e evangélicos deixarem suas diferenças teológicas de lado por um instante, em vista de um objetivo comum, não é sincretismo, é ecumenismo. No ecumenismo não há relação entre fé e heresia, há relacionamento entre pessoas de fés diferentes, com ambos mantendo sua mesma fé, deixado para discutir suas diferenças em momentos apropriados.

No estudo sobre Filipenses que participei, nem os católicos deixaram de acreditar que o Papa é o representante de Cristo na Terra, nem os evangélicos presentes passaram a acreditar nisto. Estávamos lá para estudar a carta de Paulo aos Filipenses, só isto. E, em vista deste objetivo comum, as diferenças teológicas que eram irrelevantes ao estudo da carta de Paulo aos Filipenses, foram deixadas de lado. Um exemplo parecido aconteceu quando o Pr. Silas Malafaia – falando contra o PLC 122/2006 – disse que nós somos um país onde 93% da população é cristã. Ora, o Malafaia não concorda com algumas práticas dos católicos, mas, em vista de um objetivo que é comum tanto a católicos quanto a protestantes, as diferenças teológicas foram deixadas de lado, e ele corretamente reconheceu que somos um país com 93% de cristãos.

Conseguiu compreender, Robson, o que é ecumenismo?

Se você tiver familiares que não são cristãos evangélicos vai ser mais fácil ainda entender o ecumenismo. Pois toda família que possui diferentes vertentes religiosas, é uma família ecumênica. Usando como exemplo a minha família, a minha avó é católica e – independente disto – eu a amo e respeito. Sempre que acontece alguma festividade na igreja evangélica que nós a convidamos a ir, ela vai, e vice-versa. Eu jamais vou deixar de amá-la pelo fato dela não partilhar da mesma opinião teológica que a minha sobre Maria. Eu vou continuar a amando e se um dia ela me chamar para estudar a Bíblia com ela, eu jamais negaria seu convite. Até mesmo os críticos do ecumenismo não negariam participar de um estudo bíblico com um familiar católico ou espírita se esse o convidasse. Porém, se o convite vem de um católico ou de um espírita desconhecido, os críticos evangélicos do ecumenismo não iriam, e eu não entendo por qual razão. Será que devemos amar e respeitar apenas os católicos que são nossos parentes?

De forma alguma!

Portanto, acredito que respondi e desfiz seu mal entendido sobre ecumenismo e sincretismo. São coisas totalmente diferentes. Eu nego o sincretismo, mas abraço o ecumenismo. Eu não preciso abandonar os princípios que eu acredito ser verdadeiro se eu quiser sentar na mesma mesa que um católico (ou espírita, islã, hindu, budista, ou qualquer coisa) para estudar a Bíblia ou realizar qualquer tarefa. A mim me parece ser uma tremenda falta de convicção sobre aquilo que se acredita se uma pessoa evitar conversar abertamente com alguém de uma religião diferente por ter medo de deixar de acreditar em seus princípios.

Mas, vamos prosseguir em comentar sobre seus comentários.

Você diz que “A união que prega a Bíblia é a união promovida pela VERDADE. Só a verdade une” e posteriormente diz que “Se você olhar o NT atentamente, observará que Paulo, João, Pedro, Judas gastam metade do tempo só falando para vigiar contra as falsas doutrinas, os falsos mestres. Ou seja, Deus não tolera heresias”. Ora, eu discordo profundamente de você. Primeiramente, o que une as pessoas é o amor e a tolerância e não a “verdade”. Ser intolerante nunca foi uma virtude e nenhuma pessoa jamais gostou de se deparar com uma pessoa intolerante ao expor alguma opinião sua. Sobre a segunda citação sua mencionada neste parágrafo, o fato de Paulo, João e Pedro terem gastado “metade de seu tempo” pregando contra as “falsas doutrinas” não significa que Deus não tolera heresias. Primeiro porque João, Paulo e Pedro eram pecadores tanto quanto nós somos, e eles poderiam muito bem ter enfatizado algum ponto que Jesus não enfatizou muito. Aliás, isto claramente aconteceu. Jesus jamais repreenderia algum gentio que quisesse segui-lo, mas que não quisesse se circuncidar, e vários apóstolos assim agiram (ler a controvérsia que gerou o Concílio de Jerusalém, em Atos); Jesus jamais diria que era proibido às mulheres abrir a boca na congregação, mas Paulo deu esta ordem em uma de suas cartas. Em segundo lugar, a questão da “heresia”, ao que me parece quando leio a Bíblia, era indiferente a Jesus. Cristo nunca entrou em discussões teológicas profundas durante seu ministério. Ele, do contrário, jamais (pode até reler os evangelhos com isto em mente se quiser) falou contra qualquer das religiões existentes de sua época, apenas contra a sua própria: o judaísmo. Jesus constantemente falava contra as práticas hipócritas do judaísmo (como manter o exterior limpo e cultivar sujeira no interior), mas jamais falou contra as religiões romanas, nem contra as religiões egípcias, nem contra as religiões babilônicas, nem contra as filosofias gregas. A questão da “heresia”, portanto, em minha opinião, era indiferente a Jesus. Nosso mestre sabia que as pessoas discordam em várias questões, pois cada pessoa é um universo particular de pensamentos, experiências e opiniões. A um árabe não é tão fácil se tornar cristão como é fácil a um americano, pois, ao árabe, aceitar a fé cristã é abraçar a fé das pessoas que mataram seus antepassados. Em terceiro lugar, os apóstolos falavam contra as heresias, sim, mas falavam apenas contra as heresias judaicas e as heresias gnósticas, ou seja, heresias “internas” ao próprio pensamento judaico-cristão. Paulo, por exemplo, não tinham problema algum em se relacionar com a filosofia dos gregos ou com os romanos. Existem até tradições que afirmam que Paulo manteve correspondências com o filósofo estóico Sêneca (apesar de isto ser pouco provável).

A seguir, Robson, você diz que eu não devo “chamar ‘bom’ o que Deus já disse que é ‘mau’”. Eu gostaria de saber onde foi que Deus disse que o ecumenismo é essencialmente mal. Na Bíblia, tal afirmação certamente não está, uma vez que lá somos incentivados até a “provar de tudo e reter o que é bom” (I Ts 5:21).

Prosseguindo, você questiona a “cristandade” da Igreja Católica Romana. Você pergunta: “para que teimar em encontrar cristianismo em um lugar que é óbvio que não tem?”. Mais adiante: “se você os chama de ‘irmãos católicos’, automaticamente admite que eles estão no mesmo corpo de Cristo que você, que eles vivem a mesma vida transformada que você. (...) Se você admite que eles são seus "irmãos em Cristo", então eles não precisam mais ser evangelizados!”. Bem, aqui chegamos a um ponto crucial de discordância entre eu e você: a “cristandade” dos católicos. Para você, claramente, eles não são cristãos (engraçado é que para os católicos fundamentalistas, nós evangélicos é que somos aqueles que não são cristãos). Eu discordo de você. Confesso que demorou muito para que eu chegasse a esta conclusão, mas hoje eu enxergo um católico da mesma forma como eu enxergo um evangélico.

Vamos começar por definir o termo “cristão”, afinal, se não se tivermos bem definido o que queremos dizer com “cristão”, logo não vamos chegar a lugar nenhum. “Cristão”, para mim, é aquele que reconhece que Deus, na forma de Jesus Cristo, nasceu em carne e pagou o preço que a humanidade deveria ter pago por causa do pecado, com o intuito de redimir a humanidade. Os discípulos foram chamados de “cristãos” pela primeira vez em Antioquia (Atos 11:36), e eles foram chamados assim, pois aqueles discípulos acreditavam em um tal de Jesus Cristo, que era, nas palavras de Paulo, escândalo para os judeus e loucura para os gentios (I Co 1:23).

Ora, mas se a definição de cristão é esta mencionada acima, então os católicos são sim cristãos. Independente de suas crenças periféricas que não condizerem com a Bíblia, eles acreditam que Jesus Cristo é o filho de Deus que nasceu para redimir a humanidade, e este é o núcleo da fé cristã. Você pode ler, Robson, qualquer credo, encíclica papal ou documento oficial católico, jamais um documento católico questionou o fato de Jesus ser o filho de Deus. Os católicos reconhecem que Jesus é o filho de Deus e, assim, eles são cristãos.

C. S. Lewis concorda comigo. Em suas palavras:

Ora, se permitirmos que as pessoas comecem a espiritualizar e refinar, ou, como elas diriam, “aprofundar” o sentido da palavra “cristão”, este termo também vai rapidamente se tornar inútil. (...) Não cabe a nós dizer quem, no sentido mais profundo, está próximo do espírito de Cristo, pois não temos o dom de sondar os corações humanos. (...) Quando um sujeito segue uma vida indigna da doutrina cristã que professa, é muito mais claro dizer que se trata de um mau cristão do que chama-lo de não-cristão.

Os evangélicos não estão nem aí para a preocupação de definição logo e levantam coro: Ah, mas eles são idólatras! Eles acreditam que a palavra do Papa jamais erra! Eles acreditam em outros mediadores entre Deus e os homens!

Minha resposta a isto é simples: se estas coisas são capazes de tirar a “cristandade” dos católicos, não tirariam também a “cristandade” dos evangélicos? Os católicos são idólatras, e os evangélicos também. Dá nojo ver os ídolos evangélicos da música gospel, ou os pastores das mega-igrejas, isso sem falar das idolatrias denominacionais que são muito comuns. Os católicos acreditam que a palavra do Papa é a palavra de Deus, mas os evangélicos também. Ouse questionar seu pastor dentro da Igreja, Robson, e veja o que acontece. Os católicos acreditam em outros mediadores da graça de Deus, e, para variar um pouco, os evangélicos também. Quantas pessoas não acreditam que em culto de pastor X os milagres acontecem, como se fosse este pastor X fizesse algo que os outros não fazem?

Robson, eu critiquei os católicos muito em minha adolescência, mas, no fim, percebi que os evangélicos cometem as mesmas coisas que os católicos praticam que eu considero “heresia”. E, se não os devo considerar cristãos porque existem erros em sua liturgia ou Teologia, porque deveria considerar os evangélicos como cristãos, uma vez que eles cometem os mesmo erros? É como eu sempre digo: se acreditar honestamente em algo errado fizesse Deus amar menos as pessoas, os evangélicos seriam os primeiros no ranking dos odiados por Deus. Os católicos erram? Sim, mas não há entre os cristãos aqueles que demonstram mais o amor “ágape” do que os católicos. Se por um lado os católicos erram “teologicamente”, eles de outro lado, realizam muitíssimas obras sociais em suas comunidades. Já do lado protestante, enquanto os evangélicos também erram “teologicamente” em muitas questões, eles estão pouco se lixando para as pessoas que estão morrendo de fome diariamente em nossas cidades e pregam a Teologia da Prosperidade, preocupando-se mais com seus umbigos do que com o amor ao próximo.

Lembre-se: a salvação é pela fé, mas atinge-se a fé apenas pelas obras, pois a fé sem obras é morta (Tg 2:17). Portanto, Robson, “heresia” mesmo não é errar o alvo quando se vai acreditar em algo espiritual, mas não praticar aquilo que se acredita ser verdadeiro. Cristo manifesta isto claramente na parábola do bom samaritano (Lucas 10:30-37). De acordo com esta parábola, um homem ia descendo de Jerusalém a Jericó e foi pego e maltratado por assaltantes. Aí passaram por ele sacerdotes, levitas e outros integrantes da “fé verdadeira” judaica. Se esta parábola tivesse sido escrita por Jesus nos dias de hoje, ele usaria “pastores e ministros de louvor” ao invés de “sacerdotes e levitas”. Enfim, as pessoas da “fé verdadeira” passaram e não fizeram nada para ajudar ao homem caído. Aí passou um samaritano – os samaritanos eram odiados pelos judeus, era os maiores hereges, os maiores inimigos da fé, no contexto da época – e o samaritano ajudou o homem caído. Então Jesus perguntou: qual dos três praticou o mandamento de Deus de amor ao próximo?

Isto é evidente demais! Como os evangélicos não conseguiram perceber isto?

Quem tem valor para Deus: aquele que bate no peito orgulhoso por ter a “fé verdadeira”, ou aquele que, independente de ter alguns errinhos em sua crença (ou, como o contexto de “samaritano” nos diz, ser um profundo herege), mas que pratica os mandamentos de amor de Deus na medida em que pode?

Portanto, questões doutrinárias são pontos secundários e, os católicos, por acreditarem e aceitarem o núcleo da fé cristã – Jesus Cristo, filho de Deus – e, ainda mais, por terem uma “prática cristã” muito mais efetiva e freqüente que os evangélicos, são sim, em minha opinião, cristãos, participantes do corpo de Cristo, e meus irmãos na fé.

Por fim, Robson, você chegou a mencionar em um de seus comentários os links de algumas pessoas que discordam do ecumenismo, dentre eles, um link do blog do Ciro Sanches Zibordi. Eu já li o livro “Evangelhos que Paulo Jamais Pregaria” do Ciro Sanches. Eu concordei com muitas afirmações de Ciro neste livro em relação à hipocrisia evangélica, mas em absoluto eu não concordei com suas opiniões sobre o Ecumenismo, sobre a Filosofia (seu comentário sobre Filosofia e Lógica chega a ser patético, capaz de ser refutado por um estudante do ensino médio que teve a disciplina “Filosofia” na grade) e sobre o Rock n’ Roll. Mencionei isso apenas para te dizer que eu não aceito sua menção ao Ciro não por pré-conceito, mas por ter conceito formado sobre a opinião dele sobre o ecumenismo.

E, claro, se existem aqueles que discordam do ecumenismo, existem aqueles que concordam. Algumas sugestões, para você ler depois, de ecumenistas são:

- C. S. Lewis: que além de ter sido “evangelizado” pelo seu amigo católico Tolkien, disse em “Cristianismo Puro e Simples que “O leitor deve saber desde já que não oferecerei ajuda a ninguém que esteja hesitante entre duas denominações cristãs. Não sou eu que vou lhe dizer se você deve seguir a Igreja Anglicana, a Católica Romana, a Metodista ou a Presbiteriana. Essa omissão é intencional (mesmo na lista que acabei de elaborar, a ordem é alfabética)”.

- Philip Yancey: leia seu livro “Alma Sobrevivente”, onde ele diz quais foram seus mentores espirituais ao longo de sua vida. Não apenas católicos estão lá (como C. K. Chesterton, Annie Dillard e o padre Henri Nouwen), mas como também o hindu Mahatma Gandhi.

- Ana Paula Valadão: veja vídeo abaixo:



Vou terminar minha resposta aqui. Caso algum ponto levantado por você não tenha sido comentado por mim, poste um comentário logo abaixo e eu te respondo.

Novamente, obrigado pelos seus comentários sobre meus textos.

Um abraço!


Eliel Vieira
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Existe Sentido Para Nossa Existência?

Uma das questões mais abordadas nos debates entre cristãos e ateus é sobre o sentido da existência de todas as coisas. Tudo o que aconteceu, acontece ou acontecerá neste universo, possui um sentido objetivo de ser? Existe algo que norteia objetivamente nossas ações e decisões? Ou não? Devemos responder sobre nossos atos? Se sim, a quem ou a o que devemos responder? Se não, por que no final das contas agimos como se tivéssemos que sim?

O debate é geralmente travado entre cristãos e ateus. Claro, vários representantes de outras “vertentes” também se interessam com este debate, mas, geralmente, cristãos e ateus são os protagonistas deste debate. De um lado, os cristãos dizem que se existe algo que possamos identificar como “sentido” na existência, Deus necessariamente deve existir; do outro lado, os ateus se dividem em duas posições sobre a mesma questão: (a) que os valores morais e o “sentido” existem, mas que a existência destas coisas não implica necessariamente na existência de Deus; e (b) que não existem valores morais objetivos e nem sentido para o universo uma vez que não existe nenhum Deus ou ser que regulamente sobre estas coisas.

O ateu Sam Harris parece pertencer ao primeiro grupo (aqueles que acreditam que existe sentido para a existência, mas que isto não implica necessariamente na existência de Deus). Em suas palavras:

1) Ateus acreditam que a vida não tem sentido – Pelo contrário: são os religiosos que se preocupam freqüentemente com a falta de sentido na vida e imaginam que ela só pode ser redimida pela promessa da felicidade eterna além da vida. Ateus tendem a ser bastante seguros quanto ao valor da vida. A vida é imbuída de sentido ao ser vivida de modo real e completo. Nossas relações com aqueles que amamos têm sentido agora; não precisam durar para sempre para tê-lo. Ateus tendem a achar que este medo da insignificância é... bem... insignificante. (fonte)

A segunda posição ateísta, defendida por ateus como Bertrand Russell e Nietszche, é também aceita por – para usarmos um exemplo tupiniquim – André Díspore Cancian, fundador e mantenedor do site Ateus.net, um dos maiores portais ateístas brasileiros na rede. Para André,

Quanto à moral, sou um amoralista; isso não significa que sou amoral, mas somente que defendo a inexistência de valores universais (...). Na prática, minha moral é a simples crueza de um egoísmo racional e utilitarista. Adotei a tática que me parece mais eficiente e prática para promover meu bem-estar, que consiste nesta máxima: tudo de melhor para mim e tão-somente. E para os outros? Para os outros apenas faço e desejo o bem se, em troca, me forem úteis também de algum modo; diretamente, indiretamente ou apenas potencialmente (...). No meu ponto de vista, tudo isso que estamos vivendo não passa de um resultado mecânico de fatores físicos impessoais que culminaram, através de entidades informacionais auto-replicantes – no nosso caso, o DNA –, em nossa existência enquanto máquinas, portanto sem livre-arbítrio, conscientes de si mesmas e tendo, por sua própria natureza, o objetivo da perpetuação, que por sua vez não tem objetivo algum (...). Por isso, não penso em nossa vida como uma grande maldição, mas apenas como um grande vazio onde tudo é efêmero e sem significado; mas, por isso mesmo, livre. Não poderia negar, todavia, que minha visão pessoal a respeito da realidade é um tanto funesta; mas este é meu posicionamento individual, e não tenho a menor intenção de generalizar minhas conclusões e impressões pessoais e impô-las a outrem. Apenas me espanta que a vida seja tão insignificante, tão lúgubre, durante a qual guardamos tão poucas memórias dignas de um espontâneo sorriso solitário, entre quatro paredes. (fonte)

A pergunta base aqui, portanto, é a seguinte: o universo possui sentido?

Para os cristãos (também para as demais religiões teístas e o hinduísmo), existe sim um sentido para a existência. Mesmo que não consigamos responder à questão “por que estamos aqui”, todos, no fundo, sabem que existe algum objetivo para nossa existência. No seio teísta, portanto, não há discordância alguma sobre a questão da existência de sentido para as coisas. Para aqueles que acreditam em Deus, existimos porque em algum tempo um ser infinito, absoluto e princípio explicativo de todas as coisas decidiu criar o que conhecemos como “universo”. Também, os crentes em Deus concordam que Deus nos criou para que nos relacionássemos com Ele.

Este texto, portanto, não vai focar a opinião cristã sobre a questão da existência de sentido para nossa existência. Até mesmo os ateus concordam que, se Deus existe, certamente existe um sentido para tudo o que é existente relacionado a Ele. A questão aqui é: se Deus não existe, existe sentido para as coisas existentes?

Como já foi dito, as opiniões ateístas se concentram em variações de dois extremos: a) que os valores morais e o “sentido” existem, mas que a existência destas coisas não implica necessariamente na existência de Deus; e (b) que não existem valores morais objetivos e nem sentido para o universo uma vez que não existe nenhum Deus ou ser que regulamente sobre estas coisas.

Obviamente, as duas posições não podem estar corretas ao mesmo tempo. Podemos dizer que ambas são possíveis em um “mundo possível”, mas não podemos dizer que ambas podem existir ao mesmo tempo em um mesmo “mundo possível”. Ou o universo possui ou ele não possui sentido de ser. Nenhum relativismo pode ser aplicado aqui sem que negue a lei lógica da não-contradição.

Na belíssima obra de Mary Shelley, Victor Frankenstein – um jovem muito curioso que decidiu estudar ciências biológicas e que, como resultado de sua curiosidade e de seus estudos, criou um ser vivo monstruoso que destruiu toda sua vida posteriormente – disse algo que pode nos ajudar na tarefa de responder à questão-chave deste texto. Ele disse:

“Para examinarmos as causas da vida, devemos começar pela morte”

Claro que Victor Frankenstein não estava ali dissertando sobre o sentido da vida, ou sobre a existência de valores morais objetivos que regulamentam nossa existência. Mas, a frase de Frankenstein pode muito bem ser aplicada como base para nossa resposta sobre a questão do sentido para o universo.

O universo tem sentido? Usando o princípio proposto por Frankenstein, devemos observar a “morte” – o fim de todas as coisas – antes de responder. Só saberemos se o universo tem algo sentido de ser se seu fim apresentar algum sentido objetivo que dependa de nossas ações presentes, de forma que, caso nossas práticas não condigam com o suposto sentido para o qual ele existe, ele não atinja este sentido.

Vou explicar esta questão com um exemplo mais prático: todo o mundo está preocupado com o desperdício de água. Campanhas e mais campanhas educativas são promovidas para reeducar as pessoas em relação ao uso consciente da água. Por que? Ora, porque a água é um recuso natural limitado que, se não usamos com prudência, não teremos no futuro. Se os reservatórios de água fossem ilimitados e jamais houvesse alguma ameaça de não se ter água no futuro, não haveria preocupações, nem racionamento, nem campanhas educativas sobre consumo consciente. As campanhas sobre consumo de água possuem, portanto, sentido de ser: as pessoas olharam para a “morte”, ou seja, olharam para o futuro da Terra sem água disponível e perceberam: precisamos mudar nossos hábitos, senão nossos filhos não terão o que beber no futuro.

Nossos filhos terão ou não água disponível no futuro se nós regulamentarmos com prudência nosso consumo. Nossas ações do presente vão interferir no futuro, portanto, a preocupação com o consumo de água possui um sentido. Imagine agora dois quadros ilusórios: (i) que nossos recursos fossem ilimitados independente de nossos atos; e (ii) que não tivéssemos recursos independentemente de nossos atos. Ora, em ambos os casos as campanhas relacionadas ao bom uso da água não teriam sentido algum. No caso (i) se consumíssemos 2 litros ou 2 milhões de litros de água por dia, não alteraríamos em nada a quantidade de água no futuro, pois ela seria um recurso ilimitado. Um exemplo para o caso (ii) seria, por exemplo, nossas ações em relação a espécies animais já extintas. Ora, nenhum cuidado (ou falta de cuidado) nosso em relação à natureza jamais fará com que um dinossauro (ou qualquer espécie já extinta) volte a existir.

Sendo assim, se quisermos saber se há sentido para algo, devemos olhar para o fim deste algo. Nossa existência neste universo possui sentido, uma vez que não existe Deus? Para sabermos a resposta devemos olhar para o fim do universo – sem Deus – e ver se, à luz deste fim, nossa existência possui algum sentido ou não.

E é aqui que os ateus se enrolam. Analisando esta questão, William Lane Craig diz:

Os seres humanos são apenas subprodutos acidentais da natureza que se desenvolveram em tempos relativamente recentes, a partir de uma partícula de poeira infinitesimal perdida em algum lugar de um universo hostil e sem mente, fadado a perecer, individual e coletivamente, em um período de tempo muito curto. (CRAIG, W. in: Ensaios Apologéticos - Editora Hagons, p. 159)

Ora, se não há Deus, não apenas os seres humanos, mas também o próprio universo se trata de apenas um acidente sem valor e sem propósito que, a despeito do que fizermos ou não fizermos, está condenado a um fim, onde tudo que existiu (seja bom, seja mal, vai desaparecer). Em um mundo sem Deus, o universo não tem sentido objetivo, aliás, nem mesmo a existência tem sentido. Se todas as pessoas forem más, a raça humana e o universo vão desaparecer algum dia e, se todas as pessoas forem as melhores possíveis, também. Em um mundo sem Deus, tanto os “Gandhi” quanto os “Hitler” que passaram por aqui terão o mesmo fim. Estuprar uma criança ou alimentá-la não faz diferença em mundo sem Deus, afinal, qualquer que seja sua atitude, ela não influirá no “fim” que o universo está predestinado a ter.

As palavras de André Cancián, citadas mais acima, são duras e secas, mas profundamente verdadeiras. Se não existe algo que fundamente e “regulamente” aquilo que chamamos de “moralmente correto”, por que raios deveríamos acreditar que tais padrões morais existem? Por que estupro é algo moralmente incorreto na visão de mundo ateísta? “Por que é algo que prejudica o violentado”, alguém pode responder. Mas, porque “não prejudicar o próximo” é algo moralmente correto? O que fundamenta esta moralidade? O que a regulamenta, caso alguém não a pratique? E, além do mais, por que deveria eu me preocupar com meus atos uma vez que não há nada que eu possa fazer para alterar meu destino (que é desaparecer e não levar seque um mínimo pensamento comigo para a morte) e nem o destino do universo (implodir em si mesmo – o big crunch, como dizem alguns cosmólogos – e destruir tudo o que existiu, seja bom, seja ruim).

Se Deus não existe, nada do que fizermos é objetivamente correto ou errado. Nada é bom ou ruim relacionado ao “todo” do universo. Como disse Cancián, a vida é um grande vazio, onde tudo é efêmero, sem significado, sem sentido.

Agora, porém, pergunte a si mesmo: existe sentido para as coisas? A vida vale algo? Existe sentido em travar debates sobre a existência de Deus? Por quê? Por que devemos ser seres racionais? O que você ganha sendo uma pessoa racional em relação a aquele que não é? Em relação ao fim, quem agiu melhor: alguém que depositou toda sua vida no estudo da ciência ou aquela que ficou em casa jogando vídeo-game?O universo tem sentido? Em que sentido vale à pena amar? Qual é o sentido da vida? Por que vale a pena conhecermos a nós mesmos?

Estas são as perguntas pelo ser humano desde que ele se entende como humano. Elas têm levado as pessoas ao longo dos séculos a acreditar que existe algo que fundamenta o sentido de nossa existência, o que chamamos Deus. Porém, diferentemente do que Feuerbach propôs no século XIX e que Sam Harris sugeriu timidamente na citação no início deste texto, o fato de desejarmos Deus e de este desejo estar intimamente relacionado com a questão do sentido do universo não significa que criamos Deus para satisfazer este desejo de “sentido”. O fato de eu ter desejado amar uma pessoa quando era adolescente não torna o amor que sinto atualmente pela minha namorada irreal. Algumas vezes, sim, criamos objetos e pensamentos a partir de nossos desejos, mas o fato de desejarmos um objeto não torna a existência deste objeto irreal. Em termos lógicos:

O fato de P -> Q de maneira alguma significa que Q -> P.

As perguntas sobre sentido ainda persistem para o ateu. Ele precisa responder a todas estas questões e prover algo que fundamente o sentimento de “sentido” que temos em relação à nossa existência e ao universo antes de dizer, pretensiosamente, que não existe Deus. Na ausência de uma explicação convincente por parte dos ateus em relação ao sentido do universo, sinto-me completamente nos meus direitos racionais em continuar acreditando que a explicação “Deus” é a melhor que temos em relação à fundamentação do sentido e dos valores morais no universo.


Eliel Vieira
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quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Impressões de um Sábado Ecumênico

No último sábado (29/08/2009), na Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, em Belo Horizonte, aconteceu um estudo bíblico promovido pela editora/livraria Paulus chamado “Entendendo a Carta aos Filipenses”. O presente texto traz algumas impressões que tive sobre a realização deste estudo.

Fiquei sabendo sobre este estudo um mês antes dele acontecer, enquanto ia para a faculdade. O horário, a princípio, me pareceu desanimador: de 9:00 hrs às 17:00 hrs. Passar um sábado inteiro sentado numa cadeira dura estudando uma carta de Paulo que eu já tinha lido quase uma dezena de vezes não era lá algo muito empolgante. Mas, estudar nunca é demais, então fiz minha inscrição e aguardei a chegada do dia 29/08 com certo desdém, sem ter certeza se ia ou não ao estudo. Como minha namorada ganhou uma promoção para passar um final de semana em um SPA e, como este final de semana coincidia com o sábado do estudo, resolvi ir.

Enfim o último sábado de Agosto amanheceu e, ainda assim relutante por causa da preguiça, me aprontei para ir ao local do estudo. Cheguei à Paróquia de Lourdes às 8:45 hrs e a primeira impressão que tive não me agradou muito: cerca de 20 pessoas, das quais umas 12 aparentavam ter mais de 45 anos de idade (a maioria dos presentes eram mulheres). Antes de começar o estudo, um corinho bem “brega” foi cantado a capella pelas irmãs. Aqueles corinhos que, enquanto cantados, as pessoas se abraçam e se cumprimentam. No começo me senti um peixe fora d’água naquele ambiente, mas, a alegria estampada no rosto dos presentes enquanto cantavam e se abraçavam me comoveu: as pessoas que estavam ali estavam realmente felizes e ansiosas não apenas em aprender mais sobre a Bíblia, mas para passar um dia entre amigos, em comunhão.

Algo muito interessante veio a seguir: as pessoas foram convidadas a ir ao centro da sala, dizer o nome, de onde vinham e qual comunidade elas freqüentavam. “Como sou o único peixe diferente aqui, vou ser humilde e me apresentar com as mais breves palavras possíveis”, pensei.

A irmã que estava conduzindo o estudo respondeu “Nós é que estamos aqui para aprender com você, Eliel. Você é muito bem vindo” quando eu disse em minha apresentação que era “Batista” e que estava lá para aprender com eles.

Como fui um dos primeiros a se apresentar, meus temores em razão do fato de eu ser protestante em meio a tantos católicos se mostraram não ser justificáveis: outros protestantes estavam presentes, e outros chegaram após o estudo já ter começado. Na parte da tarde – após todos os participantes terem chegado – éramos 28 pessoas lá, 19 católicos e 9 protestantes (um interessante detalhe é que dos 9 protestantes, 8 eram batistas). Estávamos, portanto, em um ambiente completamente ecumênico, onde as divergências teológicas periféricas ficaram de lado enquanto nos identificávamos sob um único pensamento comum: Jesus Cristo, o filho de Deus. Naquela reunião não éramos católicos, nem batistas, nem pentecostais, nem carismáticos, éramos simplesmente cristãos.

O interessante é que não era esperado pelos organizadores do estudo que tantos protestantes (32% dos presentes) estivessem presentes no local, especialmente por ele acontecer em uma paróquia católica. Mediante tal surpresa, a irmã que ministrou o estudo sugeriu que todos nós almoçássemos na Faculdade Evangélica de Teológica Isabela Hendrix em nome do amor e da união de cristãos de diferente confissão teológica.

Enfim, o ambiente em que estávamos era dos melhores e foi com este clima de respeito mútuo e de unidade que o estudo sobre a carta de Paulo aos filipenses aconteceu. Na parte da tarde, por volta das 14:00 hrs, para melhorar ainda mais o clima em que estávamos, o coral e a orquestra da Paróquia de Lourdes começaram a ensaiar, e o som de grandes obras clássicas do passado invadiu a sala onde estávamos sem pedir licença. Maravilhoso!

Digo com orgulho e com vergonha de que esta foi apenas a segunda ou terceira vez no ano de 2009 que saí de uma reunião cristã pensando “puxa, valeu mesmo a pena ter vindo aqui!”. Primeiramente, descobri que não conhecia praticamente nada sobre a carta de Paulo aos Filipenses – que já havia lido antes quase 10 vezes – antes deste curso. Realmente, aprendi bastante. O orgulho sentido após sair do estudo foi devido as muito boas impressões que pude extrair daquela reunião ecumênica, onde ninguém se julgava superior em nada aos demais presentes; lá não havia santos, apenas simples pecadores; gente comum, em todos os sentidos iguais, necessitados da mesma Graça de Deus; pessoas que estavam ali buscando apenas conhecer mais sobre o mesmo Deus e por em práticas a comunhão entre irmãos.

Já a vergonha sentida, foi por saber que reuniões como esta que participei são apenas exceções, e que após ter saído dali, havia voltado à minha vidinha de assistir os cultos dos “super-santos”, aqueles “apaixonados por Jesus” que estão absolutamente certos em tudo em que acreditam; que estão tão sempre certos que acham perda de tempo ouvir aqueles que discordam deles; aqueles que acham que estes que discordam não passam de idólatras pecadores filhos de Satanás que vão queimar nos quintos dos infernos.

Enfim, gostei bastante do estudo sobre a carta de Paulo aos Filipenses organizado pelos meus irmãos católicos. Deus abençoe o ecumenismo!


Eliel Vieira
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terça-feira, 1 de setembro de 2009

Carta ao Pr. Silas Malafaia: Sobre o seu Comprometimento com a Teologia de Satanás

Caro Pastor Silas Malafaia,

Antes de dizer qualquer coisa, devo ser sincero e dizer que o “caro” na saudação acima foi apenas por educação, uma vez que não vejo atualmente algo que possa identificar como louvável em você ou em suas recentes atitudes.

Apesar de bastante crítico, sou uma pessoa calma, que não briga e que raramente fica nervosa com alguma coisa. Também, apesar de já ter escrito dezenas de críticas contra posturas evangélicas que considero – para dizer pouco – prejudiciais à fé, em todos meus textos eu jamais escrevi uma carta criticando uma pessoa de forma direta. Jamais havia considerado alguém (ou uma ação de alguém) tão prejudicial ao ponto de sobre este alguém (ou sobre sua atitude) escrever um texto especificamente, mas você conseguiu esta façanha. Você foi o primeiro a realmente me deixar nervoso, irritado ao ponto de sentir nojo de alguns ensinamentos que você tem proferido.

Em homenagem à sua façanha, estou te escrevendo esta carta. Mas, por favor, não a interprete mal. Apesar de sentir nojo de algumas coisas (lê-se "quase todas") que você diz, eu o respeito como pessoa e como pensador. Afinal de contas somos todos nós criaturas do mesmo Deus, dotados da mesma capacidade racional e, claro, sujeito aos mesmos erros e enganos. Talvez no fim das contas eu esteja errado, e você certo. Mas, se assim for, te dou a oportunidade através desta carta de defender suas práticas e seus ensinamentos. Estou aberto a ouvir e analisar tudo o que disser, desde que diga com amor, e fazendo bom uso da razão simples. Apenas não venha com frases do tipo “sou profeta de Deus e você me respeite” ou “oro para que Deus te perdoe pelas suas blasfêmias” ou “não toque no ungido do Senhor”. Nada destas ladainhas de pastor que não quer ser criticado me interessam.

Para dizer a verdade, não estou nem interessado em travar debates sobre prática X ou Y, pois tais debates seriam infrutíferos, uma vez que você é mestre em manipular passagens bíblicas a seu favor como você já demonstrou diversas vezes em seus programas. Estou apenas me expondo aqui, com sinceridade, analisando suas práticas e ensinamentos à partir da maneira como as coisas "espirituais" soam a mim. Que Deus seja testemunha de que em nenhum momento desta carta eu disse algo que não esteja de acordo com a maneira como eu entendo e concebo a Palavra do Evangelho.

A prática principal vinda de você que me enoja é a famosa Teologia de Mamom. Sinceramente, deixe-me lhe perguntar: você não tem vergonha na cara de defender hoje tudo o que você pregou fervorosamente contra no passado, quando ainda era um defensor da pureza e simplicidade do Evangelho? O que aconteceu com você Silas? Como um pastor pôde se vender a tudo aquilo que uma década atrás criticava? Será que foi por causa do bigode? Será que se uma pessoa cultivar um bigode por muito tempo, quando ela o raspar, a ética irá junto pelo ralo? Ou será que você só raspou o bigode para tirar a imagem “pesada” que você tinha e assim ficar mais apresentável e bonitinho na hora que arrancar dinheiro do povo? Se for isso eu entendo, afinal, marketing é tudo! Já que você considera proveitoso gastar milhões de reais com um programa de TV que, em sua metade, consiste apenas de petições de esmolas aos tele-espectadores, sim, você precisa se aparentar bem.

É muito engraçado até. Na primeira parte do programa vemos um Silas nervoso, enraivecido, crítico em relação a aquilo que ele considera errado e muito gritador em sua pregação. Depois, aparece um cenário claro, com uma musiquinha calma e tranqüila de fundo e aí aparece o Silas, mansinho, calminho, voz tranqüila, quase sussurrando, parecendo um vovô sereno. Objetivo? Claro, pedir dinheiro. Para tal empreitada o bigode realmente atrapalhava, eu entendo. E para esmolar as justificativas são sempre as mesmas: estamos passando por dificuldades, o programa precisa de recursos para se manter, blá, blá, blá, temos uma cruzada profética, blá, blá, blá, etc.

Porém, ao que parece, precisa-se de algo mais para atrair a boa vontade das pessoas em doar seus custosos recursos ao "ministério": as promessas de prosperidade.

Oh sim! Semeie irmão! Semeie na obra do Senhor (lê-se, na conta do pastor), precisamos de pessoas liberais para doar para a obra! Deus não precisa do seu dinheiro, mas eu preciso! Doe aqui 900 reais e eu te dou de presente uma Bíblia da Vitória Financeira! Olha só, tá vendo que grande negócio? Além de ser abençoado com uma unção financeira especial você ainda vai ganhar uma Bíblia novinha, tá vendo? Mas claro, meu irmão, além de semear você precisa exigir de Deus sua vitória, pois se você doar apenas por amor você é um trouxa (fonte)! Ô Aleluia, glória a Deus! Doe e receba a unção financeira especial para a sua vida!

Quando eu escuto estas babaquices, caro Silas, em vão eu me pergunto: onde raios a Bíblia fala sobre “unção financeira especial”? Este termo existe na Bíblia? Onde a Bíblia ensina a “doar com liberalidade” com o objetivo de receber “bênçãos financeiras” de Deus? A sua Bíblia diz estas coisas? Pelo menos a minha não, afinal, a Bíblia que eu leio não é a Bíblia da “Vitória Financeira”, é uma Bíblia normal e comum.

E aqui temos, você, caro Silas, como um dos pastores mais assistidos do Brasil, levantando a bandeira de uma prática funesta, nojenta e totalmente anti-bíblica (para não dizer satânica). Quando foi que Jesus prometeu riquezas para seu povo? Quando foi que Jesus disse que devemos ofertar esperando que nosso empregadinho “Deus” nos encha de dinheiro? Quando foi, aliás, que Jesus incentivou alguma pessoa a buscar riquezas como objetivo principal de sua vida? O que Jesus disse ao jovem rico: que ele semeasse um pouco na obra do Senhor (afinal, Jesus nem jumentinho próprio tinha) para que ele ficasse mais rico ou para que ele doasse TUDO e entregasse o dinheiro aos pobres? Como conciliar as promessas de vitória e prosperidade inventadas por vocês com passagens como "no fundo tereis aflições" (Jo 16:33), "o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males" (ITm 6:10) ou "é mais fácil um camelo passar no buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus" (Mc 10)?

Diga-me, caro Silas, se Jesus estivesse no seu lugar, ele pediria as pessoas para doar ao Ministério ou diria as pessoas que vendessem seus bens e doassem aos pobres? Jesus iria mandar imprimir uma Bíblia de “Vitória Financeira”? Aliás, Jesus teria um programa de TV ou estaria nas ruas chorando com os que choram? Sobre as ofertas, será que viuvinha ofertou exigindo vitória financeira de Deus? Ou ela ofertou com amor? Se foi com amor, será que Jesus foi até ela e a chamou de trouxa, como você fez certa vez em rede nacional? A propósito Silas, minha mãe é trouxa? Pois ela nunca exigiu riquezas da parte de Deus e sempre ofertou com amor.

Quem estiver lendo esta carta pode se perguntar: mas isso foi a tanto tempo, porque você ficou nervoso com o Silas justamente agora?

Bem, foi após ver este vídeo:



Que cena mais ridícula, Silas. Você está apelando para a "numerologia gospel" agora? Então se estamos em 2009, devemos doar 900 reais para sua conta e esperar que até antes de 1º de Janeiro de 2010 vamos ser abençoados com uma “unção financeira especial”? Ora, de onde tal idiotice saiu? Foi da Bíblia? Onde eu encontro isso? Será que Jesus no ano 29 d.C. pediu ofertas de 29 denários em nome do seu ministério, prometendo assim, em troca, vitória financeira antes do dia 1º de Janeiro do ano 30 d.C. a quem ofertasse? Da boca de Jesus tal asneira não sairia. Então Silas, se seus ensinamentos não estão comprometidos nem com a Bíblia nem com a mensagem de Jesus estão com o que?

Pense um pouco: quem na Bíblia prometeu riquezas a Jesus quando este estava jejuando no deserto?

Diga-me, caro Silas, acaso você já parou para pensar na salada anti-bíblica que você está injetando na mente das pessoas? Como uma pessoa que há poucos anos atrás pregava contra a Teologia de Mamom pode ter mudado assim? Como uma pessoa como você pôde se vender a princípios de Satanás, Silas?

Talvez tenha sido rude demais nesta carta, mas é desta forma, inconformado e profundamente irritado, que me fico toda vez que ligo a TV e vejo você falando asneiras anti-bíblicas e jogando na privada todos os princípios de humildade e amor ao próximo ensinados por Jesus.

"Negar os princípios de amor ao próximo?", você pode se perguntar. Sim Silas. Toda vez que você exige prosperidade de Deus, ou, aliás, toda vez que você sequer pensa que Deus deseja que você seja rico enquanto tem pessoas lá fora morrendo de fome, você nega o princípio de amor ao próximo. Não sei quanto a você Silas, mas eu fico com vergonha e até triste por ter o que comer do bom e do melhor em casa enquanto tem crianças no nordeste que comem farinha misturado com terra.

Olhe para a imagem ao lado. Sabe do que se trata? Ela foi tirada por Kevin Carter em 1993 no Sudão. A foto retrata uma criança a beira da morte, certamente por inanição e, próximo a ela, um abutre a espreita que seu "almoço" morresse rapidamente para comê-la. Kevin Carter se suicidou cerca de um ano depois que sua foto foi publicada. Ao que tudo indica, ele não conseguiu viver com as lembranças do que ele viu no Sudão. Enquanto isso, aqui na América, Silas Malafaia, Edir Macedo, Ministério A-pá-sentar na Cabeça e outros idiotas da "prosperidade" pregam que Jesus "prometeu" riquezas para crentes e não estão nem aí para as milhões de crianças que estão morrendo de fome no mundo.

Silas, sabia que durante o tempo de seu programa "evangelístico" de TV cerca de 700 crianças morrem de fome no mundo? Puxa, como isso deve entristecer e enraivecer o coração de Jesus!

Esta carta foi um desabafo. Se fui grosso demais ou não, fica a cargo de Deus decidir. Não sou o melhor dos cristãos, sou um grande pecador, mas hipócrita eu não sou. Acredito que Deus aprecia mais a sinceridade do que a falsidade, e Ele sabe que eu fui sincero em cada palavra que eu escrevi, como também sabe que elas estão totalmente de acordo com a maneira pela qual eu entendo o Evangelho.

Será que você pode dizer a mesma coisa Silas?


Eliel Vieira
eliel@elielvieira.org

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