segunda-feira, 1 de março de 2010

Sobre o Debate Entre Silas Malafaia e Iris Bernardi

No último dia 24 de Fevereiro, foi transmitido em rede nacional um debate sobre o polêmico projeto de lei sobre o crime de homofobia, no Programa do Ratinho, na SBT. O debate foi travado entre duas “personalidades” na questão: defendendo o projeto de lei, a ex-deputada Iara Bernardi, a própria autora do projeto; criticando o projeto de lei, o pastor Silas Malafaia, um dos mais famosos pastores do Brasil, e declaradamente crítico desta lei.

Pretendo neste texto apresentar alguns comentários sobre o debate, bem como alguns vislumbres sobre o projeto de lei. Entenda este texto, se quiser, como uma resenha crítica ao debate apresentado. Caso você não tenha o visto ainda, os vídeos podem ser assistidos no Youtube.

A verdade é que o debate em si foi horroroso. “Programa do Ratinho” é um lugar de baderna, de baixaria, de “quebra pau”. A platéia e o público deste programa desejam ver não debates de idéias, mas discussões, gritaria, humilhação alheia, etc. É inegável a importância de trazer este debate para mais próximo da população, como em um programa de TV aberta, mas isto deve ser feito em um lugar propício para debates sérios e com moderadores que saibam, efetivamente, conduzir um debate.

Sobre a participação dos debatedores, e sobre “quem venceu” o debate, está se dizendo por aí (especialmente entre os evangélicos) que Silas Malafaia venceu o debate com sobras, o que é mentira. Silas Malafaia gritou mais, esbravejou mais, bem como foi mais rude e sem educação. Mas isto de forma alguma implica vitória.

Para ilustrar meu ponto imagine um jogo de xadrez entre você e um galo. O objetivo de um jogo de xadrez é e sempre será derrubar o Rei do adversário, até mesmo se você jogar contra um galo. O que vai acontecer é que, apesar de você ter mais inteligência que o galo, o animal vai bater as asas, subir em cima do tabuleiro, derrubar todas as suas peças (inclusive o rei) e depois sair “cantando de galo”, como se tivesse vencido o jogo.

Foi exatamente o mesmo neste debate: Silas Malafaia gritou mais; veio com duas dúzias de frases de efeito decoradas; interrompeu a ex-deputada sempre que pôde; levou a discussão para um campo que lhe proporcionaria vantagem; demonstrou sua total falta de decoro; debateu gritando, como se tivesse em um bar; e, obviamente, como o Programa do Ratinho é um programa de baixarias e gritarias, o pastor Silas “levou a melhor”. O próprio Ratinho “elogiou” Silas ao final do debate, dizendo, “Estou torcendo pra você continuar só neste negócio de pastor senão você toma meu lugar”.

Se o debate tivesse ocorrido em uma arena mais propícia, com tempos estipulados para ambos debatedores, com regras de decoro e conduta, com possibilidades de pergunta e resposta, com punições a ataques pessoais, com uma boa moderação, enfim, se o debate tivesse sido um debate de fato, o resultado seria provavelmente outro. É possível que até mesmo o Silas venceria (já que vários pontos levantados por ele são pertinentes), mas não seria certamente a vergonha que vimos na TV semana passada.

Quanto à controvérsia que gerou o debate em questão, eu ainda não cheguei a uma conclusão definitiva sobre este projeto de lei. Ora tendo a aceitá-lo, ora tenho resistência a ele. O pr. Silas Malafaia foi muito inteligente ao expor a agenda por trás deste projeto, mostrando que se deseja aprová-lo de qualquer forma, por quaisquer meios, deixando a controvérsia longe da opinião pública.

Dizer que este projeto se faz necessário porque “a cada três dias um homossexual morre por homofobia” é uma piada. Isto significa que temos 121 mortes de homossexuais por ano, por causa de preconceito. Vamos a alguns casos “por ano” no Brasil: o tabagismo mata 200 mil fumantes por ano (também mata 2 mil e 600 não fumantes); acidentes de trânsito matam 40 mil por ano; doenças cardiovasculares matam 300 mil por ano; acidentes de trabalho causam 3 mil mortes por ano. A se julgar pelos números, até mesmo a gripe é mais perigosa que o “preconceito”, pois ela matou em 2008 763 pessoas.

Os homossexuais afirmam representar algo em torno de 10% da população. Se este for o caso, temos cerca de 18 milhões de homossexuais no país, e deste grupo 121 são assassinatos por ano. Isto significa 0,000007% de mortes. Nada mais insignificante. Talvez unha encravada mate mais que “homofobia”.

Mas isto não quer dizer que nada deve ser feito. O Estado brasileiro é laico, portanto não pode pressupor nenhuma crença religiosa. Isto não significa que o Estado deve ser ateu, mas um Estado neutro, que legisla buscando atender o maior número possível de pessoas. Aos olhos do Estado, um homossexual é tão cidadão quanto qualquer hetero, e deve lhe ser garantido os mesmos direitos que os heteros possuem.

A verdade é que apesar do número de assassinatos/ano serem pequenos, no dia a dia os homossexuais são alvos, sim, de preconceitos. E não apenas os homossexuais, os índios e os ciganos são outra parcela pequena da população que sofrem por causa do preconceito dos “normais”. E se estes grupos sofrem por preconceito, deve-se criar mecanismo que inibam esta prática ao máximo. Portanto, mesmo que a PL 122 não seja o mecanismo a ser usado, alguma coisa deve ser feita.

E mais importante, o debate deve estar ao alcance da população, pois o Estado nada mais é do que uma representação dela. Mas, convenhamos, nada de Programa do Ratinho...


Eliel Vieira
eliel@elielvieira.org
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DESCONSTRUINDO por Eliel Vieira está licenciado sob Creative Commons Attribution.


10 comentários:

zwinglio rodrigues disse...

Eliel, paz!

Estou de pleno acordo com o seu texto...
* Sobre Malafaia, ele precisa de um treinamento quanto a inteligência emocional... rsrsr...
*
Eu tentei me lembrar, mas não consegui, onde foi que vi um quadro estatístico que mostra que a violência contra homossexuais tem sua incidência maior exatamente no universo familiar... fico devendo...
*
Abraços!

1 de março de 2010 06:06
Eduardo Vaz disse...

Eliel
Realmente o programa do Ratinho é o menos adequado para um debate. Mas vc já parou para tentar entender que o publico alvo desse programa não tem tanta informação? Bom, sendo assim seria interessante algo para a ralé , para aqueles que ao menos sabe as profundezas desse tema, e nisso eu acho que foi interessante.
Eu não sou fà do Malafaia e vc sabe, mas penso que, se o espaço foi aberto pq não aproveita-lo?Mesmo não sendo fà do tal pastor, quero deixar aqui que o mesmo vem sendo sim, aprovado quando posto a prova em programas de TV, posso citar o bombaideio com os reporters da BAND num programa sobre Jesus Cristo.Enfim, penso que se esperarmos um local adequado talvez não tenhamos nenhum espaço.BRASIL É BRASIL..
Sobre quem venceu nas argumentações, eu penso que entendi um pouco dos 2,e acho que o Silas defendeu bem a posição evangelica da coisa, afinal, eles se juntaram contra nesse projeto de lei, e ai se embasaram para dar um NÃO a isso tudo, já a EX.Deputada ficou afirmando que os homossexuais são parte da exclusão social que ocorre no Brasil. Eu entendi que o Silas teve uma melhor oratória mais apurada, salvo que seu oponente não teve destreza em Para – lo com argumentos, e isso é inegável, Silas se deu MUITOOOOOOOOOO melhor.
Eu tendo a ser a favor do que o Silas e parte dos evangélicos estão apontando como aberração, pois em detrimento disso tem vários jogos de interesse, fazendo com que a liberdade de opinião seja negada aos brasileiros .
Penso que não só os gays , mas todos , devam ter liberdade de viver o que querem, mas acrescentar um tapa liberdade seria um retrocesso no Brasil .
Sou contra a pratica homossexual e nem por isso deixo de conviver e ter amigos gays, os que andam comigo sabem disso.
Por hora, acho que outros debates deveriam ser propostos, e já acho um grande avanço terem chamado o Malafaia pq pelo menos é oq eu articula de forma inteligente a posição evangélica, diferente dos péssimos debatedores cristãos que são chamados para debates na TV brasileira, é inegável a forma inteligente que o Silas tem, e eu gostei bastante da iniciativa de chama-lo.

1 de março de 2010 06:08
Gostaria de uma solução, quero meu orkut !!!!!!!! Opções disse...

A verdade e a seguinte essa senhora viu uma oportunidade de ser eleger, com os votos do Homossexualismo olha a quantidades de VOTOS, 1 milhão e 800 mil homossexuais no país, 10% da população segundo o calculo

1 de março de 2010 07:51
Caitano Junior disse...

Só uma correção Eliel. O Brasil tem aproximadamente 180 Milhoes de habitantes, se os homosexuais são 10% isso dá 18.000.000 da população e não 1.800.000.
Então aquele número de 0,00006 que você colocou ainda se torna menor. 0,000007. salvo engano

Abraço!

1 de março de 2010 09:20
Eliel Vieira disse...

Olá Caitano,

Valeu pelo toque. Alteração procedida.

Obrigado!

Eliel

1 de março de 2010 09:32
Humberto Ramos disse...

Meu caro, infelizmente a maioria das pessoas não têm a sobriedade que você demonstra neste texto.

Só posso lamentar.

Parabéns pelas palavras.

Abraço!

2 de março de 2010 04:09
Renato Camargos disse...

Caro Eliel,

O que penso é que, com todas as críticas que merece, o Malafaia foi um dos poucos que, com coragem, colocaram a cara a tapa para denunciar o absurdo do tal PLC 122. Agora que esse projeto perdeu um pouco da sua força, várias pessoas estão se levantando para condená-lo. Mas quem estava lá para apanhar primeiro? Não estou defendendo 100% Malafaia. Concordo com muitas das críticas direcionadas à ele. Só que acho que o que ele tem feito em relação a esse assunto é muito mais coerente com o evangelho do que os que pregam que a forma de amar um homossexual segundo cristo é tratando levianamente o homossexualismo. A forma de tratar um homossexual, essa sim, pode ser ponderada mas, isso não nega uma coisa: Na bíblia, homossexualismo é pecado!!! É imoral!!! E a igreja, deve denunciar isso livremente, ou então, ao invés de ser sal da terra, será mel do mundo.

A maneira de tratar o assunto "preconceito contra homossexuais", faz parecer que não importa a força de um argumento mas, se ele não privilegiar o homossexual, então é um argumento homofóbico.

A mesma coisa parece acontecer com o tema "aborto", tem uma multidão preparada para qualificar como "hipócrita" qualquer um que se mostre contrário, mesmo antes de considerar as argumentações.

Abraços,
Renato.

5 de março de 2010 20:31
Robson disse...

Eliel, sem entrar no mérito do desempenho do Malafaia neste debate (o qual tenho opiniões diferentes da sua, mas não vem ao caso), vou fazer uma pergunta, sem o propósito de provocar, mas de identificar:

Você se considera um liberal, teologicamente falando? Como você não acredita na total inerrância da Bíblia como um pressuposto incondicional, podemos chamá-lo de liberal?

Outra pergunta: quais são os autores teológicos com os quais você mais se influenciou?

7 de março de 2010 08:22
Rodrigo disse...

É por ver coisas dessas que fico satisfeito e cada vez mais vejo que minha atitude de me desconectar completamente deste ambiente majoritário do evangelicalismo brasileiro, um fundamentalismo ( que está mais para gnosticismo do que cristianismo em diversos pontos) amalucado antiintelectual, monomaníaco e embotado. Atrofia o espírito das pessoas. E refurgita como fantoches o que os macacos chefes da direita sul-estadunidense herdeiros dos queimadores das Bruxas de Salém dita; o mais triste, é iconstatar que infelizmente é este o rosto do evangecalismo aqui, um inimigo do Brasil.

7 de março de 2010 16:06
Rodrigo disse...

Porque esse mundão "evangélico" é completamente desqualificado em tratar destes temas de Direitos Humanos? Porque seu modo de ser e entender o cristianismo os faz completamente alheios e desvinculados de todos os âmbitos e personagens que se orientam na dedicação à luta pelos Direitos Humanos Políticos, Econômicos, Sociais e Culturais, e pela Justiça Ambiental; pelo contrário, frequentemente estão na contramão destes. Se arrebatar esse povo, não faz falta alguma pro mundo.

7 de março de 2010 16:09